Título: No Quênia, OMC vai reunir 30 países
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/02/2005, Economia, p. B5

A partir da próxima quarta-feira, ministros dos países mais relevantes no comércio internacional se reunirão no Quênia para tentar dar um rumo político para a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC). O Brasil promete insistir na necessidade de haver avanços reais nas negociações agrícolas, enquanto Estados Unidos e Europa tentarão mostrar que áreas como produtos industriais e serviços não estão contando com o engajamento suficiente dos países emergentes. O processo da OMC prevê um acordo de base sobre como ocorrerá a liberalização dos mercados para produtos agrícolas, industriais e serviços até o fim do ano. O objetivo é que esse entendimento preliminar possibilite que um acordo final seja fechado até o fim de 2006. Mas, com divergências significativas entre países desenvolvidos e emergentes em todos os setores das negociações, a esperança é que sinais políticos sejam dados na África para que o processo não termine em mais um fracasso.

O encontro no Quênia, que contará com a participação de cerca de 30 países, será o segundo realizado entre os ministros neste ano. O primeiro deles ocorreu em Davos, em janeiro. Desde então, ficou evidente que, por mais que exista um acordo político para fazer as negociações avançarem, os países estão longe de se entenderem quando os técnicos se sentam para negociar os detalhes da liberalização.

No encontro desta semana, a delegação americana será comandada pelo vice-representante de Comércio, Peter Allgeier. Do lado brasileiro, problemas de agenda impedirão o chanceler Celso Amorim de estar presente para o primeiro dia da reunião, em Nairobi. Como nesse primeiro dia apenas os ministros estarão autorizados a participar do evento, o Brasil não será representado. Amorim participará dos encontros a partir de quinta-feira, quando o grupo de ministros já estiver em Mombasa, no litoral do Quênia.

O encontro no Quênia ainda será marcado pelo anúncio do Órgão de Apelação da OMC que dará, na quinta-feira em Genebra, uma decisão final sobre a legalidade dos subsídios dados pelos EUA ao algodão, questionados pelo Brasil. Em uma instância inferior, a OMC condenou as práticas americanas.

Analistas apontam que a reunião na África terá a função de apontar caminhos para que os prazos estabelecidos pelos próprios governos sejam cumpridos. Um desses prazos é o de dezembro, quando os governos terão de estabelecer fórmulas sobre como ocorrerão as quedas das tarifas para produtos industriais e agrícolas. Esse entendimento será a principal meta da Conferência Ministerial que ocorrerá em Hong Kong, no fim do ano.

O problema é que, mesmo antes de se iniciar um debate sobre qual deve ser o ritmo dessa queda para o setor agrícola, os países nem conseguem chegar em um acordo sobre como transformar as atuais barreiras quantitativas da Europa e de outras regiões em impostos sobre o valor do produto.

Atualmente, os países ricos aplicam barreiras sobre o volume importado a cerca de 14 mil linhas tarifárias no setor agrícola, atingindo produtos como açúcar e carnes. Para que haja uma negociação sobre como reduzir essas barreiras, portanto, a primeira etapa terá de ser a tradução dessas restrições quantitativas em números. Em Genebra, um processo que deveria ter sido resolvido sem problemas acabou gerando polêmica depois que os europeus propuseram uma metodologia que desagradou ao Brasil e a outros países exportadores de produtos agrícolas.

No Quênia, o Brasil promete destacar essa dificuldade para mostra que as negociações agrícolas não estão tão avançadas como alegam os países ricos. Mas tanto os europeus como os americanos insistem que está na hora de tratar de temas como a liberalização do setor industrial. Brasília diz que está disposta a fazer uma "liberalização substancial" nessa área, mas a condiciona a ganhos no setor agrícola.