Título: Cota em faculdades cria os excluídos da inclusão
Autor: Clarissa ThoméColaborou: Julio César Lima
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/03/2005, Vida &, p. A15

O estudante Luiz Carlos Simões Ribeiro Júnior, de 17 anos, ficou em 175.º lugar no vestibular de Direito, que tinha 312 vagas, mas não foi aprovado. A instituição onde ele queria ingressar, a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), oferece desde 2003 o sistema de cotas, em que 20% das vagas devem ser preenchidas com estudantes negros, outras 20% com alunos vindos da escola pública e 5% com índios e deficientes. Foi a primeira instituição do País a reservar vagas para um determinado grupo. Luiz Carlos diz que se sentiu frustrado. "A sensação é a pior possível. Eu me esforcei, mas foi em vão. Estou de volta ao cursinho, vendo as mesmas matérias novamente, pagando mensalidade de R$ 500." A Assessoria de Imprensa da Uerj informou que a instituição não divulga mais a nota dos cotistas para evitar polêmica. A nota mais baixa dos aprovados não-cotistas foi 69,75.

Thaís Araújo Medeiros, de 18 anos, ficou a apenas 75 décimos da nota mínima. "Sinto-me lesada", disse. "Fiquei chateada porque a Uerj é considerada a melhor faculdade de Direito do Rio", completou Fernanda Souto Carvalho, de 18 anos, também reprovada. Elas decidiram cursar a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde não há cotas.

Já Patrícia Correia Antunes de Paiva, de 20 anos, conseguiu vaga apenas em instituição particular. Paga R$ 1.800 de mensalidade na Faculdade Sousa Marques. "Eu acho essa cota um absurdo. Tentei para Odontologia na Uerj e estava bem colocada. Mas ficaram com minha vaga. E o pior é que dificilmente quem tirou uma nota baixa no vestibular vai conseguir concluir o curso", acredita.

O problema pode surgir em qualquer sistema de cotas que preveja a reserva de vagas. Em São Paulo, universidades criaram alternativas para a inclusão (ver texto ao lado). A sub-reitora de graduação da Uerj, Raquel Villardi, diz que o problema é a grande concorrência para poucas vagas. "A falta de investimento na educação pública superior ao longo dos anos é responsável por essa situação", diz. "Não posso dizer que o 101.º aprovado em Medicina não tem capacidade para o curso e o 100.º tem. Mas se só há vagas para cem, muitos ficarão de fora."

Para ela, não se pode menosprezar o cotista. "Com ou sem cotas, entrar na universidade é muito difícil. Todos têm mérito."

Em Curitiba, dezenas de alunos que se sentiram prejudicados pelo sistema de cotas apelaram à Justiça para garantir lugar na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Segundo o reitor da instituição, Carlos Moreira Júnior, toda mudança provoca discussão. "Vivemos o início de um processo. Os dados da inclusão são positivos e isso é muito importante, pois temos um quadro heterogêneo", opinou, lembrando que aumentou o número de negros e carentes na instituição.

Leonardo Loyola fez cursinho em 2004 para prestar o vestibular de Medicina. Mesmo atingindo uma pontuação que, segundo ele, seria suficiente para entrar na UFPR, perdeu a vaga para um dos cotistas. "A Constituição diz que todos são iguais, mas quando falam em cotas estão diferenciando. Isso é inconstitucional. Não é justo com quem investiu para estudar. O Estado que dê um ensino melhor a todos", disse ele, que entrou na Justiça para garantir sua vaga.

Esta semana, a Justiça Federal garantiu um mandado de segurança para Gabriel Padilha da Silva Freitas, que prestou Engenharia Química, e uma candidata ao curso de Zootecnia. Segundo a reitoria, os dois devem ser convocados, mas se quiserem estudar na UFPR terão de sair da Justiça. Há ainda outras cinco ações tramitando.