Título: Decisão de economizar
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/04/2005, Notas e Informações, p. A3

A ordem é poupar o dinheiro público e obter um resultado fiscal melhor que o programado oficialmente, informa-se na área econômica do governo. O ministro da Fazenda e o presidente da República já haviam anunciado a manutenção da austeridade como objetivo próprio, independente de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). O acordo expirou no dia 31 de março. A novidade, agora, é a escolha de um alvo mais elevado. A intenção é alcançar um superávit primário, isto é, sem contar o pagamento de juros, superior a 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB). Este número continuará a valer, publicamente, pelo menos por algum tempo. A mudança talvez seja oficializada no segundo semestre. A melhor política é agir sem alarde, argumentam as fontes que deram a informação ao Estado.

É possível gastar menos sem prejudicar os programas sociais e outros compromissos prioritários do governo. A administração pode cortar excessos em vários tipos de custeio, como passagens, diárias de viagem, água, energia, material e serviços terceirizados.

O aperfeiçoamento do sistema de compras também pode proporcionar economias consideráveis. Resultados melhores, enfim, são possíveis mesmo sem reformas politicamente complicadas, que permitam, por exemplo, maior flexibilidade na política de pessoal.

Neste ano, além do mais, um objetivo fiscal mais ambicioso deve ser alcançável, muito provavelmente, sem grande sacrifício adicional. Mal encerrado o primeiro trimestre, o governo já revê para mais a receita projetada para o ano. O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, e o novo ministro da Previdência, Romero Jucá, elevaram as metas de arrecadação fixadas para 2005.

Se forem alcançadas somente as metas anteriores, de R$ 315,9 bilhões para o Tesouro e R$ 105,6 bilhões para a Previdência, não haverá prêmio para os fiscais e advogados do governo. Os alvos foram elevados para R$ 319 bilhões e R$ 107,4 bilhões, respectivamente. Os novos números não são arbitrários. Refletem uma reavaliação da receita fiscal esperada para os próximos meses.

No ano passado o governo já havia revisto a meta fiscal, aumentando-a de 4,25% para 4,5% do PIB. O resultado final foi algo próximo de 4,6%. Ficou abaixo, segundo alguns economistas, do que o governo poderia ter alcançado sem aperto maior que o previsto. No final do terceiro trimestre de 2004 esse comentário já circulava discretamente em alguns meios técnicos. Neste ano, houve quem afirmasse que o superávit primário poderia ter chegado a 5,5% do PIB.

Em outras palavras: mesmo elevando a meta fiscal, o governo acabou ampliando os gastos graças à maior arrecadação, proporcionada tanto pelo crescimento da produção quanto pelo aumento de alguns tributos.

Sem o anúncio oficial de uma nova meta, mais elevada, a equipe econômica terá maior liberdade para conter os gastos, segundo se explicou em Brasília. As pressões por maiores despesas têm aumentado e podem ficar mais fortes com o fim do acordo com o FMI. Além disso, as eleições de 2006 já estão na agenda dos políticos e de seus partidos. Preocupações desse tipo em geral dificultam a boa gestão do dinheiro público. É bom, portanto, que a equipe econômica do governo se antecipe e tome providências para prevenir estragos nas finanças públicas. Mas a novidade, tal como apresentada ao Estado, só é satisfatória até certo ponto. Dentro e fora do governo é bem sabido que uma política fiscal mais severa, associada a novos padrões de administração pública, é a alternativa à política de juros que tem prevalecido. Admita-se que o Banco Central (BC) tenha exagerado na elevação dos juros e que tenha perdido, no ano passado, uma boa oportunidade para reduzi-los. Ainda assim, é preciso reconhecer que o piso dos juros, no Brasil, tem de ser bem mais alto do que seria, se as contas fiscais fossem mais próximas do equilíbrio e mais sustentáveis a longo prazo. Até empresários habitualmente contrários às decisões do BC têm mostrado que já entenderam essa restrição.

Uma política fiscal mais severa só produzirá resultados duradouros se for assumida, de forma aberta, como orientação permanente. Um esforço ocasional pode ter valor, mas politicamente é frágil.