Título: Pazzianotto ataca reforma sindical
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/02/2005, Nacional, p. A11

Ex-presidente do TST adverte que projeto do governo pode provocar impacto de "proporções imprevisíveis" no Tesouro

Fausto Macedo

O ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Almir Pazzianotto Pinto criticou asperamente o projeto da reforma sindical que o Ministério do Trabalho e Emprego enviou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para ele, a proposta de emenda à Constituição que será levada ao Congresso pode provocar "pesado impacto, de proporções imprevisíveis" no Tesouro ao prever no inciso VII do artigo 37 que a negociação coletiva e o direito de greve dos servidores serão exercidos nos termos e nos limites definidos em lei específica. "É medida completamente descabida porque o servidor é pago com verba orçamentária, que tem aprovação prévia, é verba rígida, de difícil modificação", anota Pazzianotto. "A negociação significa uma instabilidade permanente dos vencimentos dos servidores e o orçamento não pode ser espichado", alerta. "O Estado vive exclusivamente de impostos e taxas arrecadados compulsoriamente do contribuinte. O dinheiro se destina à folha, a investimentos e ao custeio. A administração pública não dispõe de recursos ilimitados. A negociação significaria necessidade de estar revendo os impostos."

Pazzianotto, ex-ministro do Trabalho no governo José Sarney (1985-1989), destaca que a verba orçamentária predefinida em lei é secular. "Não podemos romper com a tradição e abrir espaço para negociação coletiva de servidor através dos seus sindicatos. Isso vai sujeitar o Estado a uma incerteza constante a respeito do montante da folha que, a cada ano, deve ter seus limites bem definidos."

Para o ex-ministro do TST, a negociação dos servidores pressupõe uma moeda constantemente desvalorizada, inflacionada. "Vivemos um longo período assim, queremos segurança, logo os salários devem ser aumentados em função do aumento da produtividade, excepcionalmente corrigidos em virtude da inflação. Os vencimentos devem ter estabilidade para que a administração saiba o quanto arrecada e quanto gasta."

Ele ressalta que ainda não foi regulado o direito à associação sindical do servidor. "É preciso uma lei para dizer como é a entidade sindical do servidor, outra lei para negociação e uma específica sobre a greve, mas continuamos com o problema do orçamento. A menos que dêem à administração o direito de mudar a folha, o que não passa pela cabeça de ninguém. Para mudar a folha, precisa mudar a arrecadação. E aí, como é que faz o contribuinte? Todos já estamos sobrecarregados. O Estado não é entidade privada com fins lucrativos nem uma entidade assistencial."

Pazzianotto avalia que a reforma sindical que o governo Lula quer não contempla a autonomia de organização e o direito de livre filiação, previstos na Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). "Trabalhadores e empregadores permanecerão vinculados às velhas entidades, na prática impedidos de criar novas organizações e coagidos a pagar contribuições obrigatórias", diz.

Ele acentua que o projeto institui uma "cláusula de barreira", exigindo dos que pretenderem constituir uma associação que sindicalizem, no mínimo, 18% da categoria e esse patamar atinja 20% no prazo de 3 anos. Segundo Pazzianotto, existem no Brasil cerca de 18 mil entidades, a maioria composta pelos sindicatos de carimbo. "Permanecem ocultos na penumbra, foram gerados de forma artificial para participar do rateio das taxas ilegalmente arrecadadas e conferir estabilidade aos dirigentes."

O ex-ministro diz que "o esdrúxulo projeto de reforma, enganosamente apresentado como fruto de consenso da sociedade, atende exclusivamente a interesses das cúpulas". Ele condena a substituição do imposto sindical pela contribuição negocial, fixada por assembléia. A freqüência nas assembléias, muitas vezes, não chega a 5% da categoria. O imposto sindical tem valor determinado, correspondente a um dia de serviço/ano.

"É uma violência muito grande pretender que uma assembléia autorize desconto em folha do trabalhador", considera Pazzianotto. O Supremo Tribunal Federal e o TST têm jurisprudência. Quem não é associado não é obrigado a pagar contribuição, além do imposto sindical, que está em lei. Não pode uma assembléia determinar desconto do meu salário. O sindicato é entidade particular, pessoa jurídica de direito privado. Como quer se apropriar de parte do meu salário se eu manifestei desejo de não ser sindicalizado?"