Título: Sem Câmara, Serra baixa decretos
Autor: Ricardo Brandt
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/04/2005, Metrópole, p. C1

Foram 156 desde o início do ano. Sem acordo da base do governo como o Centrão, Legislativo municipal não votou nenhuma lei até agora Eleitos e pagos para legislar, os vereadores de São Paulo entram na última semana de abril sem ter votado um único projeto de lei desde o início do ano. São 83 dias de trabalho e R$ 70 milhões gastos até agora, mas nenhuma nova lei aprovada. O motivo é a falta de acordo entre a base de governo do prefeito José Serra na Câmara e os vereadores do chamado Centrão. Sem conseguir maioria, Serra só enviou quatro projetos à Casa e é acusado pela oposição de governar a cidade por decretos. Foram 156 em 110 dias de governo, a maioria para movimentação de verba entre secretarias e regulamentação de leis já existentes. Com efeito semelhante ao de uma lei, o decreto é um ato administrativo determinado pelo prefeito sem necessidade de autorização da Câmara. Mas tem função limitada.

Ocorre que, por meio desse instrumento, o prefeito criou e extinguiu secretarias, acabou com as coordenadorias de educação nas subprefeituras e transferiu cargos e competências. Esses casos, em que se estabeleceria uma nova norma jurídica, são questionados não só pela oposição, mas por advogados ouvidos pelo Estado.

"Não se pode administrar a cidade por decretos", afirma o professor de direito administrativo da Pontifícia Universidade Católica (PUC), Márcio Cammarosano. "O prefeito esqueceu o Legislativo", diz o vereador Antonio Donato, do PT, que questiona 13 decretos na Justiça.

O secretário municipal dos Negócios Jurídicos, Luiz Antônio Guimarães Marrey, afirma que os decretos são legais e fundamentados na Constituição Federal. Segundo ele, a Prefeitura não criou nenhum órgão. "Houve só mudança de nome. A Marta fez isso também", diz.

"O prefeito é centralizador e autoritário", acusa o líder do PT na Câmara, João Antônio. O líder do governo, José Aníbal (PSDB), diz que a gestão está aberta a negociar, mas não aceita trocar cargos por apoio.

ACORDO

Um acordo fechado entre os vereadores há duas semanas deve pôr fim à paralisia. Entre amanhã e quarta-feira, devem começar a ser votados os primeiros projetos. Pelo acordo, cada um dos 55 vereadores pode colocar em votação uma proposta própria.

Com isso, a Prefeitura conseguiria fazer tramitar o projeto que é sua prioridade este semestre: a reforma da Previdência, que eleva a alíquota dos servidores de 5% para 11% e representaria uma economia mensal de R$ 11 milhões.

"Houve acordo para colocar os projetos dos vereadores em pauta. Mas foi entre parlamentares, não uma conquista do governo", diz João Antonio. Segundo ele, apesar de a pauta ter sido destravada, não há consenso quanto à Previdência. O PT prepara um substitutivo. O vereador Antonio Carlos Rodrigues (PL) garante que o Centrão também prepara o seu.

Longe de ter maioria - a ala governista tem 21 votos, precisaria de 28 -, a gestão Serra corre para conseguir apoio. Tucanos apertaram o cerco para atrair membros do Centrão, conseguiram Adhemir da Guia (PCdoB) e negociam com PMDB, PL e PTB. Querem ainda o apoio do PP, mas rejeitam o vínculo com Paulo Maluf.