Título: Lula assume balcão da negociação política e põe caneta para funcionar
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/04/2005, Nacional, p. A4

Para recompor sua frágil base de apoio no Congresso depois da fracassada reforma ministerial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu ele mesmo comandar as principais negociações para a aprovação de projetos de interesse do governo no Congresso, entre eles as reformas sindical, universitária e complementar da Previdência, além da criação do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e a regulamentação das agências reguladoras. Desta vez, porém, o presidente pretende usar um instrumento mais eficiente do que a palavra. A caneta das nomeações vai funcionar. Lula orientou seus ministros a atender a todos os líderes da base aliada, a marcar as audiências que eles pedirem e a distribuir cargos do segundo e do terceiro escalões, mesmo que já estejam ocupados por petistas.

"Fazer o controle do segundo e terceiro escalões pelo lado da eficiência é correto e não deve ter cor partidária", diz o presidente do PT, José Genoino.

Com isso, o presidente espera contentar seus aliados e acabar com as surpresas desagradáveis dos últimos meses, quando teve de assistir à rebelião que elegeu Severino Cavalcanti presidente da Câmara (PP-PE). O governo perdeu também o controle da base quando entrou em discussão a Medida Provisória 232, que concede correção de 10% na tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) mas aumenta o imposto para os prestadores de serviços. O jeito foi mobilizar todo mundo para derrotá-la.

Lula determinou ao ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, que faça um cadastro de tudo o que há de pedidos feitos pelos partidos, seja para a liberação de emendas de parlamentares, seja para o preenchimento de cargos nos Estados, e os encaminhe a ele. Um dos problemas o próprio presidente já resolveu. Na semana passada foi enfim nomeado para a presidência de Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) Luiz Apolônio Neto, indicado pelo PTB há um ano e meio. A nomeação não saía nunca porque o PT a retardou o mais que pôde. O PTB deu-se por satisfeito.

Agora, por recomendação de Lula, a caneta vai agir rapidamente. E os petistas que ponham as barbas de molho, porque vão perder cargos. No meio da semana passada, quando passava o maior aperto na Câmara por causa da MP 232, o presidente Lula aproveitou uma reunião com os ministros Antonio Palocci (Fazenda), Aldo Rebelo (Coordenação Política), Jaques Wagner (Desenvolvimento Econômico e Social) e Luiz Dulci (Secretaria-Geral da Presidência) para perguntar: "De que adianta ter um integrante da DS (Democracia Socialista, tendência esquerdista do PT) lá na Fundação Nacional da Saúde (Funasa) se ele não nos ajuda? Faz campanha contra o governo, tenta sabotar tudo", disse Lula, de acordo com relato de um ministro. "Esses terão de dar o lugar para nossos aliados."

A intenção do governo é montar uma base com cerca de 260 deputados fiéis. Para isso, Lula precisa contar com o PMDB e com o PP. Não com sua totalidade, porque isso ele não tem nem no PT. Mas com pelo menos a metade, o que já daria para estruturar a base pretendida. Por esse plano, as alas fiéis do PP e do PMDB vão ser contempladas com cargos; as infiéis continuarão a fazer a oposição, sem que o governo se importe com elas. Quanto às reformas constitucionais, são necessários 308 votos para aprová-las na Câmara e 49 no Senado. Faltam, portanto, 48 votos de deputados. "Vamos negociar o mérito dos projetos. Esses votos poderão ser buscados, por exemplo, nos partidos de oposição", diz o ministro Aldo Rebelo.

"É preciso consolidar a continuidade do bom momento econômico. A semana que passou foi muito boa para a economia", diz José Genoino.

"Além da não renovação do acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Brasil subiu três posições entre as maiores economias do mundo e voltou ao 12.º lugar. Além do mais, a maioria das categorias profissionais teve reajuste salarial acima da inflação. Tudo isso é motivo para reconquistarmos nossa base", continua Genoino.

No Senado os problemas para o governo são menores do que na Câmara. Para o líder do governo, senador Aloizio Mercadante (PT-SP), além de a Casa não criar caso com o Palácio do Planalto, tem uma oposição responsável. "Eu sempre dialogo com os senadores Arthur Virgílio (líder do PSDB, do Amazonas), Tasso Jereissati (PSDB-CE) e José Agripino Maia (PFL-RN). Aqui, a gente sempre negocia o mérito de cada projeto. A proposta das parcerias público-privadas (PPP), por exemplo, foi muito melhorada pelo senador Jereissati".