Título: Rejeição da Carta pelos franceses pode estagnar UE
Autor: Reali Júnior
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/04/2005, Internacional, p. A13

O referendo do dia 29 de maio na França sobre a Constituição da União Européia está deixando de ser um problema de política interna. Além de dividir a classe política francesa em campos antagônicos, acima das diferenças partidárias, transformou-se numa questão vital para a Europa. Depois da manifestação do primeiro-ministro espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, favorável à aprovação do texto, também o presidente de Portugal, Jorge Sampaio, que está em visita oficial à França, defendeu o "sim". Portugal, a exemplo da França, organiza um referendo para ratificar o texto constitucional europeu, já aprovado pelos governos da UE.

Na véspera, o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Joschka Fischer, em visita a Reims com seu colega francês, Michel Barnier, já havia declarado que "o futuro da Europa está na dependência do voto francês". Na opinião dele, a decisão francesa não vai se restringir a uma questão de política interna, mas envolve o futuro da própria União Européia. Ele teme que se o "não" sair vencedor, o processo de construção da União Européia poderá ficar estagnado por muito tempo.

Apesar dos apelos e advertências dos dirigentes dos países europeus, as pesquisas de opinião pública francesas estão consolidando a tendência de voto negativo - tanto pelo eleitorado de direita quanto pelo de esquerda. Um novo estudo, divulgado ontem pelo jornal Le Figaro, indica que 53% dos franceses votarão "não", 47% "sim" e 21% não quiseram se manifestar.

Na chamada esquerda parlamentar, 60% estão optando pela rejeição da Constituição da UE. Entre os partidos da coalizão conservadora, a porcentagem, mesmo em crescimento, é inferior: 34% vão votar "não", 28%, "sim". Já na extrema direita francesa constata-se a mais alta porcentagem de rejeição - 75% dos eleitores estariam dispostos a votar "não". Pelo menos 60% disseram que se trata de uma opção definitiva.

Para Fischer, chefe da diplomacia alemã, o "não" constitui o fim da União Européia. Nunca um dirigente da importância do ministro alemão se manifestou tão claramente contra as conseqüências do voto negativo para realçar a importância da decisão francesa de 29 de maio. A advertência de Fischer foi dirigida aos que não imaginam ou não querem acreditar que a rejeição da Constituição possa ter uma grande repercussão nas relações entre os dois países, como, por exemplo, enfraquecer o eixo franco-alemão.

O exemplo dessa cooperação foi a posição comum entre os dois países, que enfrentaram os Estados Unidos na crise iraquiana - uma aliança que poderá relançar a idéia de uma política externa européia e uma política de defesa comum.

França e Alemanha esperam voltar a se constituir no motor da construção européia, mas para isso terão de encontrar solução para o problema do desemprego que atinge 2,5 milhões de franceses e 5 milhões de alemães. Esses números estão entre as taxas mais elevadas de desemprego da União Européia.