Título: Greenhalgh pede a Lula que enquadre os aliados
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/04/2005, Nacional, p. A6
Dois meses e seis dias depois da derrota na disputa para a presidência da Câmara, o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) decidiu romper o silêncio. Dizendo estar "com um gosto de guarda-chuva na boca" diante da pasmaceira na Câmara, Greenhalgh afirmou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa impor limites e enquadrar a base aliada - definida por ele como um conjunto que "só se sacia de devorar devorando" -, se quiser ser reeleito em 2006. "Essa política de gestão salomônica do governo provoca a crise que estamos vivendo ora na Câmara ora no Senado", insistiu.
Ao falar sobre o risco de Lula não ser reeleito, Greenhalgh repetiu o discurso do chefe da Casa Civil, José Dirceu, que, ao conversar com petistas das alas moderadas, no Rio, afirmou não ver um segundo mandato como líquido e certo. Mas o tom do ministro foi diferente do usado pelo deputado. Dirceu apelou para o desprendimento do PT em nome da montagem do palanque de Lula com tapete vermelho para o PMDB. Greenhalgh, por sua vez, pediu reação contra a tentativa de desconstruir o partido do presidente.
"A base aliada tem estabelecido mecanismos de pressão e chantagem sobre o governo. Só se sacia de devorar devorando. Tenta crescer apostando no isolamento do PT. Então o PT, como carro-chefe da coalizão, fica enfraquecido e isso enfraquece o Lula. Não dá para continuar assim", protestou. Advogado do Movimento dos Sem-Terra (MST), Greenhalgh perdeu em fevereiro a disputa na Câmara para Severino Cavalcanti (PP-PE), depois de enfrentar traições de aliados e a rebeldia do colega Virgílio Guimarães (PT-MG), que foi candidato avulso.
QUARENTENA
Desde então ele fugiu dos holofotes. "Estava em quarentena", justificou ao Estado. Greenhalgh disse ser favorável a uma ampla frente partidária para reeleger Lula, desde que o Planalto não se iluda e veja as "contradições internas" de sua base de apoio. "Os governadores do PMDB e o Garotinho (Anthony Garotinho, secretário de Governo do Rio) não querem essa aliança."
Em tom de advertência, o deputado afirmou que o governo precisa tomar mais cuidado com a movimentação de seus parceiros. Lembrou que a popularidade de Lula já caiu 6 pontos porcentuais - de 66,1% em fevereiro para 60,1% em abril -, de acordo com a última pesquisa do Instituto Sensus, encomendada pela Confederação Nacional dos Transportes.
Ex-integrante da esquerda petista e hoje próximo do campo majoritário, Greenhalgh apontou movimentos sistemáticos para isolar o PT. Na lista, enfileirou argumentos usados por adversários e por aliados do PMDB, do PTB e do PL de que o PT quer todos os cargos, não abre espaço para os outros, prima pela arrogância e é ineficiente no governo.
"É um erro não reagirmos. Na eleição à presidência da Câmara enfrentei a mesma coisa: de um lado a base aliada me isolou e de outro a oposição me desconstruiu. Agora, nós estamos emparedados e sendo tratados como se nada estivesse acontecendo", desabafou. "Lula deveria deixar claro para os aliados que o PT é o seu partido e que não se deve isolá-lo."
Sem maioria no Congresso, o governo vive uma situação difícil. Na Câmara, dez medidas provisórias trancam a pauta e o Planalto não consegue costurar um acordo para pôr em plenário a reforma tributária. Foi obrigado a recuar na MP 232, que corrigia a tabela do Imposto de Renda em 10% e aumentava a carga tributária dos prestadores de serviço.
"Vai acontecer a mesma coisa com a MP 242", previu Greenhalgh, numa referência à medida que torna mais rígidas as regras para trabalhadores da iniciativa privada terem direito a auxílio-doença. "Na Câmara, tudo serve como pretexto para criar problema. Deveria haver um núcleo do governo que se inteirasse dos problemas e avisasse o presidente Lula: 'Vai dar errado'", concluiu o deputado.