Título: Produção de carros continua em alta
Autor: Cleide Silva
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/06/2005, Economia, p. B6

Apesar da gritaria em relação aos juros altos e ao câmbio desvalorizado, a indústria automobilística segue em rota de crescimento, após uma interrupção em abril. No mês passado, o setor produziu 213,4 mil veículos, o segundo maior volume mensal da história. O principal propulsor foram as exportações, que registraram valor mensal recorde de US$ 896,5 milhões. No acumulado de janeiro a maio, a produção está 15,6% maior que a do ano passado, e soma 984,8 mil veículos. As exportações totalizam US$ 4 bilhões, 35,4% a mais do que em 2004. O ritmo de crescimento é inferior ao do ano passado, que nesse período contabilizava aumento de 50%, mas a própria Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) já previa essa desaceleração antes mesmo da desvalorização do dólar.

O balanço, entretanto, não diminui as críticas das montadoras à atual política cambial. "O câmbio tem impacto dramático na lucratividade das exportações e, mais para a frente, com certeza também deve afetar os volumes", diz o presidente da Anfavea, Rogelio Golfarb, ao ressaltar que algumas empresas começaram a reduzir embarques.

Ele avalia que a manutenção das exportações, em parte, se deve ao crescimento de importantes mercados que compram automóveis do Brasil, como Argentina, México, Chile e Venezuela.

Golfarb espera que os juros permaneçam inalterados neste mês e, a partir de julho, o Banco Central comece a reduzir as taxas. As vendas internas também recuperaram fôlego após a queda de abril e aumentaram 3,9% no mês passado, para 143 mil unidades. No ano, o acumulado de 651,6 mil veículos vendidos é 10% acima de 2004.

BICOMBUSTÍVEL

Em maio, pela primeira vez, as vendas dos veículos bicombustíveis (rodam com gasolina ou álcool) ultrapassaram as dos modelos movidos só a gasolina. Carros com essa tecnologia desenvolvida no Brasil responderam por 49,5% dos negócios, ante 43,3% daqueles abastecidos exclusivamente com o derivado de petróleo. O primeiro motor flexível chegou ao mercado em março de 2003, no Gol 1.6.

Segundo Golfarb, os carros flexíveis não promoveram aumento de mercado, mas substituição de compra. "O crescimento está relacionado principalmente à maior disponibilidade de produtos." Todas as montadoras estão ampliando oferta ou lançando produtos com a tecnologia flex. No futuro, a maioria dos modelos novos sairá de fábrica com esse tipo de motor.

A tecnologia também deverá ser exportada. Na opinião de Golfarb, entre os combustíveis atuais, quase todos derivados do petróleo, e a célula combustível, que não emite poluição, devem se passar cerca de 50 anos. "Até lá, a tendência de usar combustíveis renováveis deve crescer e o Brasil terá grandes oportunidades de exportar álcool em toda a sua cadeia." Já há interesse, segundo ele, da Tailândia, Japão e China.

A indústria criou em maio 116 empregos, ampliando o quadro de pessoal para 104.542 trabalhadores. De acordo com a Anfavea, recentes anúncios de programas de demissão voluntária são situações pontuais. Já as fabricantes de máquinas agrícolas demitiram 87 trabalhadores, enquanto as de automóveis contrataram 203. As vendas nesse segmento caíram 33,8% no ano, para 10.122 unidades, redução provocada pela quebra da safra.

"Estamos com números crescentes num ambiente macroeconômico que não contribuiu para isso", ressalva Golfarb, ao tentar explicar os resultados positivos do setor. Em maio, a produção de veículos cresceu 4,9% ante abril e 19,2% em relação a igual mês de 2004. Em volume, só ficou atrás do resultado de março, quando atingiu o recorde de 218,6 mil unidades.

A Anfavea mantém a perspectiva de chegar ao fim do ano com produção de 2,3 milhões de veículos e exportações equivalentes a US$ 8,9 bilhões, ambos resultados recordes. As vendas internas serão 7% melhores que em 2004, devendo somar 1,6 milhão de unidades. "Não acredito que a questão política terá participação determinante nos caminhos da economia", diz o executivo, ao comentar os escândalos envolvendo membros do governo. Para ele, uma revisão nas perspectivas do setor só deve ocorrer se o BC insistir em aumentar os juros, o que poderá afetar tanto o mercado interno quanto as exportações.