Título: Contrato com Eletronorte facilitou crédito de R$ 12 mi
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/07/2005, Nacional, p. A7

O Banco Central enviou documentos à CPI dos Correios que podem comprovar o esquema de "contratos de boca" entre o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, suposto operador do mensalão, e o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Os papéis revelam os caminhos que Valério seguiu para obter o dinheiro que teria sido repassado para o PT, e não declarado à Justiça Eleitoral. Faz parte da documentação um contrato de publicidade firmado com a Eletronorte. Usando esse contrato como garantia, Valério tomou R$ 12 milhões no BMG, montante que foi depositado em uma conta do Banco Rural, instituição apontada como caixa do mensalão. Dirigentes do partido, indicados por Delúbio, sacaram o dinheiro.

O esquema dos "contratos de boca" foi revelado pelo próprio Delúbio à Procuradoria-Geral da República. Ele estimou que o total dos empréstimos girou entre R$ 35 milhões e R$ 40 milhões. Mas os técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) que auxiliam a CPI calculam que o valor repassado ao PT pode chegar a R$ 70 milhões, fora juros e correção.

Deputados que integram a CPI estão convencidos de que o contrato de publicidade com a Eletronorte é um forte indício de que o PT captou recursos vultosos obtidos com suporte do próprio governo - no caso, os contratos de Valério com as estatais que estão sendo rastreados.

O empréstimo de R$ 12 milhões com o BMG foi realizado a favor da SMPB, uma das agências do empresário, no início de 2003. Na época, Valério usou como penhor outra agência dele, a DNA, e o contrato dela com a Eletronorte. A CPI já identificou outro empréstimo de Valério no BMG, de R$ 15 milhões, para a Graffiti Participações, negócio que teve como garantia contrato de publicidade com os Correios.

Em seu depoimento à Procuradoria da República, Delúbio admitiu os negócios "de boca" com Valério e alegou: "Em razão da legislação brasileira, os partidos políticos têm dificuldades em financiar suas atividades exclusivamente com os recursos formais, doações, fundo partidário, contribuições de filiados. No caso do PT, a despeito de ter obtido êxito na eleição presidencial, teve muita dificuldade nas campanhas municipais de 2004."

Delúbio afirmou ao procurador-geral Antonio Fernando e Souza que "entre 2002 e 2003 foi muito pressionado pelos diretórios estaduais com relação aos débitos da campanha de 2002 (presidencial, deputados federais e estaduais)".

As dívidas dessas campanhas, segundo ele, geraram débitos de R$ 20 milhões para o PT. Delúbio disse que o primeiro empréstimo foi de R$ 10 milhões, mas os técnicos do TCU identificaram que esse empréstimo foi de R$ 12 milhões, que a SMPB tomou junto ao BMG. "O PT emprestou para não gerar expectativa infundada nos eventuais contribuintes", declarou o ex-tesoureiro.

Para o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), os negócios entre Delúbio e Valério garantiram retribuição ao empresário por meio das contas que ele ganhou, do Banco do Brasil e dos Correios. "Delúbio optou pelo empréstimo, pois sabia que seu amigo Valério teria uma expectativa fundada, e não infundada, e ele teria como corresponder a essa expectativa dando contas do governo para as empresas do publicitário", destacou Sampaio.