Título: Pesos pesados de Lula vão à oposição para frear idéia de impeachment
Autor: Vera Rosa e Christiane Samarco
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/08/2005, Nacional, p. A8

Os ministros mais influentes do governo montaram uma operação para evitar a abertura de um processo de impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e vão retomar as conversas com a oposição nos próximos dias. O time escalado para a tarefa é composto por Márcio Thomaz Bastos (Justiça), Antonio Palocci (Fazenda) e Jaques Wagner (Relações Institucionais). O trio já desempenhou essa missão há um mês, mas sem êxito. Agora, porém, a situação é mais delicada. "Não podemos permitir que nosso projeto seja interrompido", afirmou Lula na reunião ministerial de sexta-feira, na Granja do Torto. Um dos ministros presentes ao encontro disse ao Estado que o governo sairá da defensiva. "As energias podem estar voltadas para a CPI, mas o País não pode parar por causa da crise política", afirmou. "O governo precisa governar."

Na prática, porém, ninguém sabe o que fazer. No Palácio do Planalto, a preocupação com a crise aumenta a cada dia. "O governo não vai enveredar pelo populismo econômico, mas será feito um chamamento para que a crise não contamine mais a economia", resumiu o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP).

Thomaz Bastos e Palocci vão procurar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o senador Marco Maciel (PFL-PE). "Fernando Henrique está nos recomendando cautela. Ele está assombrado", contou o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM).

Com a paralisia dos petistas diante do envolvimento de seu partido num esquema de corrupção que envolve sonegação fiscal, evasão de divisas e compra de votos no Congresso, os líderes das legendas de oposição no Senado e um grupo suprapartidário de deputados começaram a articular uma saída institucional para a crise.

As cúpulas de PSDB, PFL e PPS vão reunir-se amanhã para avaliar a agenda dos próximos dias nas CPIs dos Correios, do Mensalão e dos Bingos, que mais uma vez podem trazer depoimentos explosivos, entre os quais o do tesoureiro informal do PTB, Emerson Palmieri. Discutirão, ainda, o parecer das assessorias jurídicas dos partidos sobre a fundamentação de um eventual pedido de processo de impeachment contra Lula.

Com o agravamento da crise política nos últimos dias, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também se empenha em atrair para o diálogo não só os líderes de oposição. Além de conversar com pefelistas e tucanos, Renan está procurando líderes da base aliada, do governo e do PT. Foi o que fez, em almoço informal na sexta-feira, em que reuniu na residência da presidência do Senado Virgílio e os líderes na Casa do PFL, José Agripino Maia (RN), e do PT, Delcídio Amaral (MS), que preside a CPI dos Correios.

ESGARÇAMENTO

A avaliação geral é de que o PT vive hoje um processo de esgarçamento que tende a se aprofundar por causa das exigências da base de punir os parlamentares envolvidos nas denúncias sobre o mensalão. Os líderes dos partidos acreditam, ainda, que o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), perdeu as condições políticas de comandar um processo de negociação e diálogo. Para piorar a situação, a Câmara está praticamente sub judice, tantos são os pedidos de cassação de parlamentares de praticamente todos os partidos.

ALTERNATIVAS

"Estamos discutindo alternativas de futuro, considerando que Renan é a única autoridade, neste momento, com livre trânsito em todos os partidos", explicou Agripino. Ele também está entusiasmado com a adesão do presidente do PPS, deputado Roberto Freire (PE), ao diálogo, por se tratar de um dos mais severos críticos da administração petista.

"Temos de conversar e estar em articulação permanente para não sermos surpreendidos com um pedido de impeachment de uma legenda menor, como o PPS", acrescentou Agripino, certo de que essa articulação de líderes aponta para uma convergência. "Quando a crise ficar incontrolável, o entendimento já estará em marcha."

É com esta preocupação que Renan convidou os líderes para uma avaliação dos cenários possíveis com o desdobramento da crise política. O entendimento geral é o de que ninguém tem o controle dos fatos. Ao contrário, argumentam, os fatos é que vão pautar se vai ou não haver impeachment, diante da reação da opinião pública às denúncias que surgem a cada dia.

A articulação dos parlamentares na Câmara é mais complicada por conta do envolvimento dos líderes nas denúncias de corrupção. Mas a despeito de as bancadas estarem soltas, sem comando, uma dezena de parlamentares de PMDB, PPS, PV, PDT, PSDB e PT fez na semana passada a primeira reunião para discutir a situação.

O grupo de deputados reconhece que não tem força suficiente para sustentar uma ação política contra ou a favor do governo, mas reúne parlamentares influentes em seus partidos e a idéia é ir agregando mais gente. "Nossa pretensão é chegarmos a algo entre 30 e 50 parlamentares, entre deputados e senadores que também já estão conversando. Aí sim, teremos capacidade maior de articulação", aposta o deputado Gastão Vieira (PMDB-MA).

ISOLADO

Segundo o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), que participa do grupo, o sentimento predominante é o de que a crise é muito grave e o presidente Lula está isolado. Embora alguns tucanos tenham comparado esta crise com a do governo Collor, vários deputados chamaram a atenção para as diferenças de temperamento e perfil entre Lula e Fernando Collor. Prevaleceu a avaliação de que, se Lula tiver de deixar a Presidência antes do fim de seu mandato, ele apelará para as ruas e criará um grande tumulto de conseqüências imprevisíveis, o que pode dividir o País. E isto é algo que ninguém quer.