Título: Petrobrás quer inibir uso de gás
Autor: Nicola Pamplona e Kelly Lima
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/08/2005, Economia & Negócios, p. B6

RIO - A Petrobrás pode lançar mão de medidas de desestímulo ao uso do gás natural em indústrias, comércio ou veículos, informou ontem o presidente da companhia, José Sérgio Gabrielli. Ao detalhar o plano de negócios da estatal para o período 2006-2010, ontem, o executivo informou que as térmicas terão prioridade entre os consumidores do combustível e admitiu que os preços para outros usos deverão aumentar. "O Brasil não suporta ter um mercado de gás crescendo 20% ao ano", afirmou Gabrielli. Segundo o plano de negócios, o País estará consumindo 99,3 milhões de metros cúbicos de gás por dia em 2010, volume 28% maior que o estimado na última versão do documento, de 2003. O segmento que mais ganhou espaço no novo plano foi o térmico, cuja estimativa de consumo em 2010 passou de 27,1 milhões para 46,4 milhões de metros cúbicos por dia.

A previsão para a indústria teve pequena alta, de 36,7 milhões para 39,1 milhões de metros cúbicos por dia. Já a estimativa para outros usos para o gás, onde se inclui o gás natural veicular (GNV), ficou estagnada em 13,8 milhões de metros cúbicos por dia.

A preocupação com o crescimento do mercado brasileiro de gás já foi externada pelo governo em diversas ocasiões. Estudos do setor alertam para o risco de falta do combustível já a partir de 2007. A falta de novas fontes de oferta, principalmente após a crise boliviana, nublou ainda mais o cenário. Com o aumento de impostos naquele País, diversos projetos foram suspensos, até que a indústria se adapte à nova realidade.

Gabrielli informou que a Petrobrás mantém o projeto de ampliação do gasoduto Bolívia-Brasil dos atuais 30 milhões para 34 milhões de metros cúbicos por dia, apesar da crise no país vizinho. Além disso, a empresa antecipou as operações do campo de Mexilhão, na Bacia de Santos, para 2008. Assim, o País estará produzindo 69,6 milhões de metros cúbicos por dia em 2010, volume que, somado às importações da Bolívia, vai garantir o suprimento, segundo o executivo.

A mudança no cenário foi provocada por alterações na regulação das térmicas promovidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Agora, todas as usinas têm de provar que terão gás suficiente para operar a plena capacidade. Gabrielli disse que a operação simultânea das usinas é pouco provável, mas a estatal terá de disponibilizar todo o volume previsto nos contratos.

Segundo o presidente da Petrobrás, o aumento do preço do gás anunciado na sexta-feira ainda não pode ser encarado como medida de desestímulo ao consumo. "Estamos apenas repassando alta de custos", explicou. Mas ele avalia que o preço do gás para uso não térmico é muito barato no País e algumas indústrias podem usar combustíveis alternativos. A própria estatal está convertendo suas usinas para se tornarem bicombustíveis, a fim de garantir mais flexibilidade no mercado de gás.

A empresa manteve o projeto do Gasoduto Sudeste-Nordeste (Gasene) em seu plano de investimentos, mas agora com início de operações previsto para 2008, um ano depois da estimativa inicial. O presidente da Petrobrás informou que uma licitação para encomenda de materiais está em curso.

No novo plano de negócios, que prevê investimentos de US$ 56,4 bilhões até 2010, a Petrobrás reduziu em pelo menos um ponto porcentual o conteúdo nacional médio de seus projetos, de 66% para 65%. A maior redução foi na área de exploração e produção, de 61% para 51%. Segundo Gabrielli, essa queda foi motivada por um aumento no número de afretamentos de unidades de produção que estão sendo feitos para acelerar projetos.

Um exemplo desse caso é o do plano de exploração do campo de Golfinho, que possui óleo leve e deverá entrar em operação já em 2006, em vez de apenas em 2008, se a empresa optasse pela construção de uma nova plataforma.

Manter a média de conteúdo nacional em torno de 65% significa que ficarão no País investimentos da ordem de US$ 6,2 bilhões por ano até 2010. Os setores de construção e montagem e aquisição de materiais serão os mais fortalecidos, com 77% dos investimentos. No total serão criados 160 mil empregos diretos e 501 mil indiretos até 2010, segundo a Petrobrás.