Título: Rebeldia teen pode estar no cérebro
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/09/2005, Vida&, p. A16

A angústia, os conflitos existenciais e os embates dos adolescentes com figuras de autoridade - caracterizados pela tendência de os adolescentes acreditarem que apenas eles estão certos e o mundo é que está na contramão - podem ser provocadas por modificações no cérebro dos jovens durante a puberdade. Mas há uma boa notícia para os pais atormentados com essa fase, que parece não ter fim: os problemas são, sim, passageiros. A capacidade de meninos e meninas de decodificar indícios sociais diminui entre os 12 e os 14 anos, segundo uma pesquisa feita por profissionais da University College London e do Institute of Child Health (Institute de Saúde Infantil), ambos da Grã-Bretanha.

"Parece que isso acontece em função do desenvolvimento do cérebro deles nesse período", afirmou ontem o professor David Skuse, da unidade de Ciência Comportamental da universidade, ao apresentar os resultados do estudo. "É de fato um fenômeno de base biológica, do qual, felizmente, eles se recuperam", acrescentou.

Assim, em vez de os adolescentes rebeldes estarem sendo deliberadamente obstinados ou difíceis, a explicação para isso estaria no cérebro. Ele seria incapaz de detectar sinais sutis vindo de pais, professores e outros adultos ou de decodificá-los corretamente.

Os mesmos circuitos cerebrais envolvidos no reconhecimento de expressões faciais estão também associados ao processamento do tom de voz, segundo Skuse.

"A habilidade de interpretar um tom de voz irritado e a capacidade de interpretar uma expressão facial de raiva podem se deteriorar durante o começo da adolescência", explica ele. Isso justificaria o fato de os jovens não atenderem, de imediato, às ordens e de terem maior dificuldade de aceitar determinados padrões comportamentais.

Há indícios, porém, de que o problema desapareça em torno dos 16 ou 17 anos.

PESQUISA EM AUTISMO

Skuse, que apresentou as conclusões na conferência da Associação Britânica para o Progresso da Ciência, em Dublin, Irlanda, descobriu essa diminuição da capacidade de detectar sinais sutis durante a puberdade quando analisou 6 mil crianças como parte de uma pesquisa sobre autismo, um mal que afeta muito mais garotos do que garotas.

Todas as crianças com idades entre 6 e 16 anos foram solicitadas a executar determinadas tarefas como lembrar rostos, estabelecer contato visual e distinguir emoções olhando fotografias de rostos que demonstravam felicidade, tristeza, raiva, medo, surpresa e repulsa.

"Todas essas são habilidades relacionadas com nossa capacidade de interagir apropriadamente com as outras pessoas e são habilidades que, supostamente, são deficientes em pessoas autistas", explicou Skuse.

Skuse e seus colegas descobriram que, aos 6 anos, as meninas são melhores do que os meninos em interpretar emoções e indícios sociais. Mas, na puberdade, quando o corpo está passando por transformações hormonais, há uma queda nessa habilidade de executar essas tarefas em ambos os sexos.

"É como se o cérebro, nesta fase da puberdade, quando está se reorganizando e sofrendo alterações hormonais, tivesse uma piora considerável na capacidade de reconhecer expressões faciais. Isso explicaria a dificuldade em alguns tratos sociais", analisou Skuse.