Título: A pior tributação do mundo
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Fonte: O Estado de São Paulo, 03/10/2005, Notas e Informações, p. A3

O Brasil não tem apenas uma carga tributária muito pesada, que no ano passado equivaleu a 35,8% do valor produzido pela economia. Tem também a pior tributação do mundo, segundo o último relatório de competitividade do Fórum Econômico Mundial. Por esse quesito, ficou em 117º lugar numa lista de 117 países pesquisados. Essa carga aumentou durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e não há sinal de que deva parar de crescer em 2005 e 2006, apesar das promessas do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, de conter a voracidade fiscal. O governo federal arrecadou, no primeiro semestre deste ano, R$ 235,2 bilhões, segundo o Tesouro Nacional. Esse valor corresponde a 25,6% do PIB. No ano passado, a arrecadação equivaleu a 24,2% da produção, entre janeiro e junho. Em 2002, quando a receita fiscal chegou ao nível máximo do governo de Fernando Henrique, a fatia tomada pela União não passou de 23,9% - e já foi excessiva.

Os governos estaduais e municipais fazem o possível para não perder o passo e tentam acompanhar o avanço da administração federal. Também têm feito, portanto, o possível para extrair recursos de quem se esforça para produzir e faz malabarismo para não baixar o padrão de consumo.

Esse esforço nem sempre dá certo, porque a mão do Fisco é geralmente mais pronta quando aparece algum dinheiro a mais. Pior para os trabalhadores e para as empresas, porque sobra menos para investir na produção, para criar empregos e para consumir.

Mas a voracidade do Fisco, embora enorme, pode nem ser o fato mais grave. Cinco das dez economias mais competitivas, na avaliação do Fórum Econômico Mundial, são nórdicas: Finlândia (1ª), Suécia (3ª), Dinamarca (4ª), Islândia (7ª) e Noruega (9ª). Esses países têm carga tributária maior que a do Brasil, embora tenham procurado reduzi-la a partir dos anos 90. A da Finlândia foi diminuída para 45,2% do PIB, a sueca, para 52,6%, a norueguesa, para 42,3%, e a dinamarquesa, para 50,1%. Como podem conciliar tributação tão pesada e tão alta produtividade econômica?

Em primeiro lugar, a tributação é funcional, isto é, os impostos são concebidos de tal forma que não atrapalhem muito as decisões econômicas. Em segundo lugar, o dinheiro recolhido pelo governo é bem aplicado. O contribuinte paga muito, mas também recebe muito em termos de educação, saúde, segurança, justiça, ambiente e infra-estrutura. Não por acaso os países mais competitivos incluem-se também entre os de maiores índices de desenvolvimento humano.

Esse quadro é o oposto do observado no Brasil. O setor público brasileiro arrecada de forma danosa para a economia e gasta de maneira desastrada. A baixa qualidade da tributação brasileira é assunto dissecado pelos especialistas há muito tempo. Há impostos cumulativos. A tributação incide sobre a compra de máquinas e equipamentos. As exportações ainda não estão inteiramente desoneradas, apesar da legislação sobre o assunto. Exportadores têm dificuldade para liquidar créditos fiscais.

Além do mais, o sistema é imensamente complicado. O peso real da tributação não consiste apenas no valor entregue ao Fisco. Seu custo inclui também o trabalho despendido com a enorme burocracia do sistema.

Do outro lado das contas, há a baixíssima qualidade dos gastos públicos. Todo cidadão brasileiro sabe que paga muito para receber pouco do Estado. No quesito "desperdício do gasto público" o Brasil ocupa o 111º lugar na classificação de competitividade do Fórum Econômico Mundial. Em relação ao desperdício, quatro dos seis classificados em posição pior que a do Brasil são latino-americanos e isso também não é surpresa.

As melhoras introduzidas na tributação brasileira, nos últimos anos, foram muito limitadas. Quanto ao projeto de reforma do sistema, ainda em tramitação no Congresso, dificilmente produzirá grande melhora. A fome de impostos, tanto da União quanto dos Estados e municípios, impediu que projeto fosse mais favorável à modernização do País. Será preciso recomeçar a discussão, mesmo que seja aprovado.