Título: Empresas adaptam produtos de exportação para islâmicos
Autor: Alberto Komatsu
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/10/2005, Economia & Negócios, p. B3

Bois, frangos, gelatina, roupas e até ônibus têm de seguir normas da fé muçulmana

Na última quinta feira, 1.825 bois vivos foram embarcados em um navio atracado no Porto de Belém, no Pará, para uma viagem de 15 dias até o Líbano. Esse é um exemplo de como empresas brasileiras estão se adaptando para exportar mais para os países árabes. Até agosto, as vendas cresceram 27,3%, com receita de US$ 3,3 bilhões. A lista de adaptações continua com gelatina, ônibus com teto removível para peregrinos rezarem voltados para Meca e lojas de roupas sem provadores. Os bois embarcados são tratados por uma tripulação de 24 pessoas. Eles cuidarão da alimentação e limpeza para evitar propagação de doenças. No abate chamado de halal, que segue as normas do islamismo, os bois são pendurados de cabeça para baixo, voltados para Meca, e o abatedor muçulmano faz a degola pronunciando algo como "em nome de Deus". Se o boi se debater, é descartado.

"O abate halal tem objetivos sanitário e religioso. O animal não pode sofrer, caso contrário libera uma enzima no sangue que pode contaminar a carne", explica o secretário-executivo da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, Michel Alabi.

O Pará é o principal exportador de gado vivo. De acordo com o chefe de gabinete da Federação de Agricultura e Pecuária do Estado do Pará, José Ferreira Teixeira Neto, as vendas de boi para o Líbano vão aumentar 12 vezes, já que ano passado foram 20 mil cabeças. Este ano, há potencial para embarcar 240 mil cabeças.

O frango é abatido de forma similar. Nesse caso, o sangrador - que tem de ser muçulmano - faz um movimento de corte em forma de meia lua no pescoço. Tudo isso supervisionado por um inspetor islâmico.

No primeiro semestre, as vendas de frangos para os árabes cresceram 25%, com receita de US$ 1,5 bilhão. Para a Sadia e a Perdigão,tradicionais exportadoras de frango para o Oriente Médio, a região já responde, em média, por 20% da receita total de exportação.

A Hering vive uma situação peculiar no mundo árabe, para onde deverá exportar US$ 1,5 milhão este ano. Na Arábia Saudita, a empresa tem quatro lojas sem provadores de roupa. As muçulmanas compram as peças sem provar, para não correrem o risco de serem vistas pelos balconistas homens.

"Não existe balconista feminina na Arábia Saudita, onde as mulheres só podem ter alguns tipos de profissão. Até em lojas de lingeries os atendentes são homens", conta o diretor de Comércio Exterior da Hering, Ulrich Kuhm.

As exportações de gelatina para o Oriente Médio também têm de respeitar preceitos religiosos, conta a vice-presidente da Gelita para a América do Sul, Cláudia Yamana. Hoje, o mundo árabe responde por 5% do faturamento da empresa, que envia em torno de 1 mil toneladas de gelatina para uso em doces e confeitos. Um xeque supervisiona a produção por amostragem, conta Cláudia.

Em 2003, a fabricante de carrocerias para ônibus Marcopolo recebeu uma encomenda inusitada: desenvolver um ônibus com teto removível para que os peregrinos que vão à cidade sagrada de Meca possam orar durante a viagem. Foram 270 unidades exportadas para a Arábia Saudita.