Título: Referendo: pergunta confunde 29%
Autor: Fabiano Rampazzo
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/10/2005, Metrópole, p. C1

"O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?" Diante dessa pergunta, cada eleitor vai manifestar seu desejo, daqui a 11 dias, no referendo de 23 de outubro, teclando o número 1 (não) ou 2 (sim). O problema é que a pergunta está provocando confusão entre eleitores e o resultado do referendo pode não traduzir o desejo da população. A reportagem do Estado esteve ontem na Praça da Sé, marco zero de São Paulo, e ouviu 100 pessoas, das quais 29 erraram no voto, declarando uma resposta contrária a posterior justificativa. Carlos Nascimento, de 62 anos, representante comercial, percebeu a reportagem e fez questão de manifestar seu voto pelo "sim". Ao justificá-lo, manteve a mesma convicção e esbravejou: "Tem que ter arma, sim. O cidadão tem o direito de se defender, homem de Deus. Sem falar nos empregos que vão ser perdidos se não tiver mais armas." Nascimento, contudo, deseja o "não" nas urnas, e seu equívoco não foi exceção. Os erros aconteceram a favor e contra a proibição, entre homens e mulheres, jovens e idosos. E de forma convicta.

A pergunta - definida no decreto legislativo 780 - causou dúvidas mesmo entre os entrevistados que acertaram. Dos 71 acertos, 7 entrevistados pediram a confirmação. "Sou contra o comércio de armas, mas o 'sim' é para proibir, né?", questionou a estudante de Direito Lívia Heringer, de 19, que é a favor da proibição por entender que as pessoas não têm treinamento nem condições de possuir armas de fogo no Brasil.

Outro acerto, dessa vez sem titubeio, veio do estudante Eric Silva, de 19, para quem o comércio de armas e munição não deve ser proibido. Silva foi enfático no "não". "Vou votar 'não', está decidido."

Dos 29% que se equivocaram nas respostas, a maioria associou corretamente a sentença ao número. Mas o acerto parava por aí. "O 'não' é 1, né?", perguntou Izaias da Silva, correto na associação, mas errado na intenção. "Eu vou de 'não'. Não quero armas mesmo", sentenciou o engraxate.

Esse nítido embaralhamento de informação na cabeça dos entrevistados foi o motivador para o erro da dona de casa Aparecida de Fátima. "Meu voto é no 2, no"sim". Por quê? Porque as armas têm que continuar, ué. Acho justo cada um ter a sua, se quiser, não é mesmo?"

Em todos as respostas equivocadas, o "sim" ou o "não" vieram seguidos de justificativa lógica, acusando a linha de raciocínio que motivou o erro na cabeça do eleitor consultado. "Não. Sou contra as armas", declarou o garçom João Camargo. "Sim, tem que oferecer uma resistência para o ladrão", disse Ezequiel da Silva, bancário.