Título: 'Governo Lula fez um pacto com o diabo', diz Alencar
Autor: Guilherme Evelin
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/10/2005, Nacional, p. A16

O vice-presidente José Alencar deu ontem "nota zero" para a política monetária do Banco Central e disse que o governo Lula fez um "pacto com o diabo" quando adotou os juros altos para estabilizar a economia e controlar a inflação. As afirmações foram feitas por Alencar, também ministro da Defesa, ao participar de sabatina promovida pelo jornal Folha de S. Paulo, em que ele voltou a fazer da política econômica o seu alvo preferido para críticas ao governo. Segundo deixou a entender o vice-presidente, o "diabo" seria "a banca internacional" que aplaudiu as medidas tomadas pelo governo Lula, assim que tomou posse em 2003, para acalmar um mercado financeiro inquieto com a chegada do PT ao poder. Depois acrescentou que o "diabo" é também a acomodação a uma política que causa "empobrecimento" e não permite a exploração do potencial de crescimento do País.

Fazendo alusão ao slogan cunhado pelo marqueteiro Duda Mendonça para a campanha presidencial de Lula em 2002, Alencar pregou um rompimento com a atual política monetária, que pode ser mudada, segundo ele, de forma responsável. "Vamos perder o medo de ser feliz. Essa política mantém o medo de ser feliz", afirmou. Ele voltou também a dizer que o discurso de campanha feito por ele e Lula, na campanha, não assumiu o poder.

Ao justificar a "nota zero" para a política monetária, o vice-presidente disse que ela não é austera do ponto de vista fiscal. Citou números dos gastos do orçamento da União com o pagamento de juros: mais de R$ 420 bilhões, nos últimos três anos. Se metade desse valor tivesse sido economizado e direcionado para investimentos, o Brasil ainda teria a taxa de juros básica mais alta do mundo, mas "estaríamos em outro mundo em matéria de saneamento, educação, defesa, segurança pública", argumentou.

MÉDIA PONDERADA

Alencar atacou ainda a ineficácia da política de juros altos para controlar a inflação. Disse que um terço da inflação se refere a preços administrados em setores oligopolizados, que não caem com a subida dos juros. "A taxa pode ser de 100%, que ela não fará diferença para os bens administrados e para o cartel do petróleo da Opep."

Apesar da "nota zero" para a política monetária do Banco central, Alencar disse que dá uma "nota 7" para o governo Lula, resultado - brincou ele - de uma "média ponderada". Para o vice, são dignas de "nota dez" a política externa, a sensibilidade com a área social e a "preocupação com a probidade".

Ao falar sobre o escândalo do mensalão, o vice-presidente defendeu o presidente e o governo. "O presidente não tem tempo para cuidar de assuntos partidários. Isso saiu do seio de um partido, e não do governo."

Defendeu a cassação de todos os parlamentares flagrados pelas investigações do Congresso com caixa 2 em campanhas, mas ponderou que, se a fiscalização fosse rigorosa, até o seu mandato de senador, conquistado em 1998, poderia ter sido cassado. Contou o caso de um amigo, Ildeu da Silveira, dono de uma gráfica, que doou "santinhos" para a sua campanha, omitidos da Justiça eleitoral.

Alencar esquivou-se, o quanto pôde, de dar pistas sobre os seus planos para 2006. E tentou desvincular a sua filiação ao Partido Municipalista Renovador (PMR), recém-criado pela Igreja Universal do bispo Edir Macedo . "Eu me filiei a esse partido porque tenho mania de começar da estaca zero. Não sou candidato a nada." Mas ele próprio ressalvou que a declaração refere-se apenas ao presente e não significa que não possa vir a ser a candidato.