Título: Carvalho diz que objetivo da CPI é atingir o presidente
Autor: Leonencio Nossa e Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/10/2005, Nacional, p. A5

Um dia depois de ser acusado pelo juiz afastado João Carlos da Rocha Mattos de coordenar o esquema de arrecadação de recursos para o PT em Santo André, o chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Gilberto Carvalho, comparecerá hoje à CPI dos Bingos para a acareação com dois irmãos do prefeito assassinado Celso Daniel, em meio à guerra aberta entre governo e oposição. "Estou consciente de que a intenção de tudo isso é atingir o presidente Lula", afirmou Carvalho ao Estado. "Mas acho que o pior da crise já passou", disse, beijando o crucifixo que carrega no peito. O chefe de gabinete passou o dia de ontem reunido com advogados e assessores, preparando-se para a acareação com João Francisco e Bruno Daniel. Os dois irmãos do prefeito asseguram que Carvalho comentou com eles ter transportado R$ 1,2 milhão em dinheiro vivo para o então presidente do PT, José Dirceu, em 2001. O dinheiro seria produto de extorsão praticada pela prefeitura de Santo André com o objetivo de financiar o partido.

Ex-secretário de Governo e de Comunicação de Santo André, Carvalho sempre negou a acusação. "Estava pensando: tenho 55 anos e trabalho desde os anos 70. Meu patrimônio se resume a um carro e um apartamento no valor de R$ 90 mil em São Paulo, que acabei de pagar só agora, com dificuldades. E estarei na CPI, diante dos senadores. Alguma coisa está errada. Tudo é muito difícil, mas estou tranqüilo", comentou.

Carvalho chegou a pôr o cargo à disposição de Lula por mais de uma vez. "Você só pode estar brincando, não é, Gilberto?", devolveu o presidente, que o considera um irmão.

Ao Estado, o chefe de gabinete disse estar sofrendo com os ataques que tentam associá-lo ao esquema de corrupção na prefeitura de Santo André. Afirmou, porém, que pretende esclarecer todas as dúvidas dos senadores na CPI dos Bingos."Fico chateado com as ilações, mas é preciso respeito à CPI", observou o homem que acompanha Lula há mais de 20 anos.

No terceiro andar do Planalto, a poucos metros do gabinete presidencial, o ex-seminarista Carvalho recebeu orientações para a acareação de hoje, que será aberta. O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, foi um dos conselheiros e negou que o Planalto tenha trabalhado para que a sessão fosse secreta.

"Acho um absurdo o que estão fazendo com o Gilberto", endossou o ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Jaques Wagner. "Acareação é coisa de polícia." Com ele concordou o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), que ontem também passou pelo Planalto. "A CPI está reabrindo o caso numa atitude claramente política. "Querem fazer conexões com irregularidades e colocar o PT e o governo numa situação difícil."

O vice-presidente José Alencar argumentou, porém, que uma investigação deve ir às últimas conseqüências toda vez que houver dúvidas. "Sempre fui a favor de investigações duras e profundas", disse, apesar de ressalvar que considera Carvalho "um rapaz sério e de muito valor."

Preocupado, Lula escalou ministros para conversar com a oposição. Seus interlocutores apelaram para que a CPI mantenha o "decoro" e não baixe o nível. "Eu garanti ao governo que não haverá constrangimento", contou o senador Romeu Tuma (PFL-SP).