Título: Tasso defende impeachment e acusa governo Lula de 'assalto ao Estado'
Autor: Christiane Samarco
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/10/2005, Nacional, p. A10

O senador Tasso Jereissati (CE) considera ¿um fato gravíssimo, sob todos os aspectos¿ a notícia de que o PT teria recebido dólares do governo de Cuba para sua campanha presidencial de 2002. Desde que comprovada a informação, divulgada pela revista Veja, o senador ¿ que vai assumir a presidência do PSDB no dia 18 ¿ acredita que Lula ¿não vai ter condições de governar¿ e que ¿vai ter que entregar o cargo¿.

Na sexta-feira, antes mesmo de saber da reportagem, Tasso dizia considerar legítimo um processo de impeachment contra o presidente. ¿Montaram um esquema de assalto ao Estado¿, explicou, convencido de que há espaço para que um processo de impedimento tenha apoio popular. Para o líder tucano, nas últimas semanas a crise ficou ¿tão aguda¿ e Lula ¿tão fraco¿ que seu partido teve de pôr o pé no freio. ¿Mas agora é diferente¿, adverte. ¿Lula estava caladinho, humilhado. De repente saiu arrogante em campanha, atacando em vez de governar¿, diz nesta entrevista ao Estado.

Se for comprovada a notícia de que a campanha presidencial do PT recebeu US$ 1,4 milhões, ou US $ 3 milhões de Cuba, que resposta o senhor espera do governo?

É um fato gravíssimo sob todos os aspectos. Se for comprovado, o presidente não vai ter alternativa, não vai ter condições de governar. Vai ter que entregar o cargo. É um governo estrangeiro elegendo um presidente da República. Uma das coisas mais graves da Constituição Brasileira.

O que a oposição pode fazer diante da denúncia?

É mais um motivo para a instalação de uma nova CPI, que deixa de ser a do caixa 2 e passa a ser do financiamento ilegal de campanha. Todas as pessoas envolvidas têm que ser chamadas imediatamente.

Com que discurso o senhor assumirá a presidência do PSDB?

Temos de começar a discutir uma proposta para o País, porque o PT não tem. Vamos discutir os grandes desafios. O partido que enfrentou o grande desafio da inflação em 1994 enfrentará uma conjunção de três problemas na economia: juro alto, baixo crescimento e péssima distribuição de renda.

Por que o PSDB subiu o tom contra o governo? Quando afastou Azeredo da presidência houve uma declaração de guerra ao governo e ao PT?

O que acentuou a crise não veio desta semana, mas de algum tempo para cá. O PT foi vítima de uma saraivada de denúncias que chocaram o País e foram se acumulando sem dar tempo ao governo para respirar. O que mudou não fomos nós, o PSDB e o PFL, mas a postura do presidente Lula diante da crise.

Mas as pesquisas apontam hoje a melhora do desempenho de Lula.

Há uns 20 dias a crise deu uma esfriada mesmo. Houve boas notícias na economia e Lula saiu da depressão. Aí deu para viajar e fez a única coisa que sabe fazer bem feito: campanha. Em vez de fazer o que o País precisa, saiu batendo na gente Brasil afora, no exterior, e deu a senha para o PT também. Os ataques do PT foram meio conjugados.

O senhor quer dizer que foi Lula que elevou a temperatura da crise?

Quando Lula se recolheu por causa das denúncias, a oposição mostrou muito equilíbrio. Esperávamos também uma atitude de conciliação do governo. Não foi para fazer pizza que nos portamos assim. Ninguém quer pizza ou impunidade. Queríamos uma autocrítica, mudanças profundas e um chamamento a um novo momento.

Não foi então o PSDB que mudou, diante dos ataques contra o senador Eduardo Azeredo, que acabou deixando a presidência do partido?

Isso já foi conseqüência. O que mudou foi o presidente Lula. O grande responsável por essa mudança toda, pelo agravamento da crise, é o Lula. No sistema presidencialista, é o presidente quem lidera, quem dá o tom. Se acirra, se ameniza, se ataca ou se chama para o diálogo.

E o presidente Lula saiu no ataque?

Em vez de adotar tom de conciliação, já saiu em campanha eleitoral, batendo, como se nada tivesse acontecido. Agiu como se não fosse presidente e não estivesse no meio de uma crise, com contas enormes a explicar ao País. Foi assim que ele acendeu todo o espírito de acirramento que está aí.

Antecipando a eleição de 2006?

Ele claramente antecipou 2006 e entrou em campanha. Saiu fazendo provocações, comparações, falando em urucubaca, e deu o sinal ao PT. O presidente do PT, Ricardo Berzoini, já fala e ataca. O antecessor Tarso Genro também. Foi claramente algo articulado. Ele está tão obcecado pela campanha que esquece o rabo imenso que deixou para trás. Lula só pensa em eleição, se esquecendo de que para se reeleger tem de governar.

Mas o governo diz que a oposição radicalizou exatamente pela melhora do presidente nas pesquisas.

Esse é o problema do PT e do governo: eles só pensam em eleição. É preciso pensar na crise, em governar o País. Só estamos conseguindo surfar este vendaval porque estamos vivendo um momento mundial fantástico. O País está se acabando com o problema da aftosa. A agroindústria está se acabando. O governo está parado. Na administração nada acontece. Agora é que vai ter herança maldita para valer para o próximo governo.

Quando o PSDB propôs a CPI do Caixa 2, foi um recado ao presidente?

O PT está obcecado de maneira doentia pelo poder. Morre de medo de perder a eleição. Passamos este tempo todo abertos ao diálogo mas eles só pensam na eleição. O PFL bateu muito mais no governo do que o PSDB e eles nos atacam porque vêem na gente o adversário de 2006. Azeredo não pode ser cassado por uma eleição que perdeu em 1998. Ele não foi em boca de caixa pegar dinheiro, não recebeu direto de Marcos Valério.

Mas houve um cheque de R$ 700 mil de Marcos Valério para a campanha dele em 1998.

O que existe é uma declaração de Valério de que foi ao Banco Rural pegar um empréstimo para financiar a campanha de Azeredo. Por isto chamaram o tesoureiro da campanha. Azeredo não pode ser crucificado por uma eleição que perdeu. Mas Valério pegou dinheiro para Lula, que foi eleito. Delúbio Soares também confirmou na acareação que passou dinheiro.

O senhor defende o impeachment?

Defendo que esses episódios sejam levados a termos jurídicos. Marcos Valério e Delúbio confirmaram o caixa 2 de Lula e o que parecia óbvio tornou-se público e explícito.

Quando a oposição decidiu pôr o pé no freio porque o governo estava fraco, avaliava-se que a opinião pública não queria o impeachment.

Lá atrás houve a avaliação de que não havia clima. Mas apareceu mais coisa de lá para cá e se continuar...

Então pode haver respaldo popular a um processo de impeachment?

Acho que sim. Este governo está provocando um clima de acirramento, em que as questões vão ficando muito mais emocionais. E essas questões gravíssimas que estão aí, que ficaram mal resolvidas, não vão se resolver. Vão se aprofundar.

Que fatos novos podem levar a população a querer o impeachment?

Há coisas mais graves para aparecer. Não existe preparo para a compreensão do momento. O papel verdadeiro do governante implica uma visão de estadista e não reduzir tudo à questão eleitoral. Taí o programa do PT de rádio e TV, que foi ao ar quinta-feira. Totalmente eleitoral, nos atacando e fazendo comparações.

Mas todos os partidos fazem programas eleitorais.

Mas você nunca viu um programa do nosso partido, nos 8 anos de governo FHC, que fosse atacando outro partido. O PSDB sempre levantou o ânimo da Nação, procurou mostrar como o País ia bem. E não atacando partidos de oposição.

Lula é conciliador ou incendiário?

Pode ter 500 conciliadores que não resolve. O que precisa é de um líder que dê o tom. Um líder que dê o toque de recolher ou a ordem para marchar. A grande responsabilidade no momento cabe a Lula. Está na hora de ele assumir o papel de presidente.

Por que o senhor acusou o PT de fazer caixa 3, além do caixa 2?

O PT tentou passar a idéia de que todo roubo valia porque era caixa 2. Era uma coisa que todo mundo fazia e, por isto, era perdoável. Apelidou-se caixa 2 o crime eleitoral de recursos de campanha não contabilizados. Mas o próprio tesoureiro do PT do Ceará declarou que não recebeu para a campanha. Está na cara que nem caixa 2 era. O dinheiro foi para alguém. Pena que PC Farias esteja morto. Se vivo, hoje ele estaria redimido.

O esquema montado pelo PT é mais grave, maior, que o esquema PC?

Se o PC tivesse dito que todo o dinheiro era do caixa 2 que todo mundo faz, ele estaria igual a Delúbio. Existe caixa 2, e isto é crime eleitoral. Mas o caixa 2 é um crime generalizado porque são doações de pessoas que não querem aparecer. O problema é que tudo o que foi feito de errado o PT diz que é caixa 2. Não tinha campanha nenhuma, nem eram doações. Era corrupção pura e simples.

Se não é caixa 2, o que é?

Montaram um esquema de assalto ao Estado. Desde 1º de janeiro de 2003 até estourar o escândalo do IRB, dos Correios, que todos os organismos do governo federal assaltam os cofres públicos.Tiraram e desviaram dinheiro por meio de concorrências fraudadas, tráfico de influência, serviços pagos e não realizados, achaques.

A proposta de CPI do caixa 2 é uma ofensiva ou um recado para o presidente, de que, se tiver caixa 2 para Azeredo, terá para Lula também?

Se tiver para um, terá para outro. É mais que um recado. Na verdade são dois. No caso do caixa 2, a primeira campanha que terá de ser examinada é a de Lula. Mas vamos apurar o que foi desvio. Nos Correios, houve desvio de dinheiro seu, meu...