Título: Manobra de Lula fracassa e CPI dos Correios continua em 2006
Autor: João Domingos e Cida Fontes
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/11/2005, Nacional, p. A4

Fracassou a operação comandada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para impedir a prorrogação da CPI dos Correios. Uma reviravolta de última hora impôs ontem uma nova derrota ao governo e a comissão de inquérito vai funcionar pelo menos até 11 de abril, ou seja, avançará no ano eleitoral. Do Palácio do Planalto, Lula chefiou pessoalmente as negociações para que os parlamentares retirassem as as suas assinaturas do requerimento de prorrogação da CPI em troca da liberação de verbas . Na meia-noite de quinta-feira, Lula chegou a comemorar a vitória, ao saber da desistência de 67 deputados. Pelo cálculo, o total de assinaturas caíra de 237 para 170- uma a menos do que o necessário para prolongar os trabalhos.

Só que a oposição pediu recontagem. Pouco depois das 11 horas de ontem, a Secretaria-Geral da Câmara concluiu que só 66 assinaturas retiradas tinham sido válidas e considerou que o requerimento contava com apoio de 171 deputados. Ao governo - que queria ver o fim da CPI em 11 de dezembro - restou lamentar a derrota.

"O rolo compressor do governo engripou", ironizou o deputado Alberto Fraga (PFL-DF), que não é da CPI, mas aproveitou para falar pela oposição, já que os líderes de fato e direito estavam longe de Brasília.

O Planalto prometeu mundos e fundos para evitar que a CPI entrasse em 2006. Segundo os próprios parlamentares, o governo anunciou a liberação de R$ 1,2 bilhão para emendas até o fim do ano. Esse tipo de emenda, geralmente para a construção de pontes, quadras, escolas e postos de saúde, é uma importante moeda eleitoral para os deputados.

SUSTO

A desmobilização dos líderes governistas foi muito grande. Eles foram pegos de surpresa e o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, estava no exterior. Desesperado com a notícia da prorrogação da CPI dos Correios, o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), correu para o gabinete do presidente da Casa, Aldo Rebelo (PC do B-SP).

Lá, Chinaglia e Aldo conferiram assinatura por assinatura. Perceberam que a do deputado Francisco Dornelles (PP-RJ) fora considerada inválida porque os computadores e os técnicos não a reconheceram.

"O deputado Dornelles retirou a assinatura", insistiu Chinaglia. Por telefone, Dornelles confirmou. Chinaglia recorreu ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Renan, a quem cabe toda decisão quando a CPI é mista, orientou o secretário-geral da Mesa, Raimundo Carreiro, a considerar válidas as 171 assinaturas. "O que vale é o regimento. A CPI foi prorrogada", anunciou Carreiro.

MANOBRA

O governo queria insistir na retirada de outras duas assinaturas, além da de Dornelles: dos deputados Carlos Willian (PMDB-MG) e Wladimir Costa (PMDB-PA). Mas pelo menos até ontem não teve êxito.

Os peemedebistas retiraram as assinaturas às 23h37. Mas às 23h59 os nomes deles foram entregues à Secretaria-Geral da Mesa do Senado como apoiadores da prorrogação.

Nesse caso, houve cochilo do governo. Conseguiu convencê-los a recuar, mas a oposição tinha se preparado para o ataque governista e fez uma "reserva técnica". Como o que vale é a assinatura entregue por último, a oposição só registrou os nomes perto da meia-noite.

"A oposição usou uma estratégia mais inteligente, de entregar a minha assinatura por último. Mas, ainda assim, isso não está de acordo com a minha vontade. Vou entrar com recursos para que prevaleça a minha assinatura de retirada", disse Carlos Willian.

"Agora, a CPI terá uma responsabilidade muito maior", disse o deputado Luiz Antonio Fleury Filho (PTB-SP), que retirou a assinatura. "O governo sofreu desgaste desnecessário."

O líder do PSDB na Câmara, Alberto Goldman (SP), disse que a CPI focará os trabalhos: "Vai atrás da origem do dinheiro, tentará descobrir como foi enviado para o exterior e como foram feitos os pagamentos."