Título: UE tenta rachar o G-20 e se dá mal
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/12/2005, Economia & Negócios, p. B6

Europeus propõem elevação de cortes de tarifas na tentativa de opor o Brasil à Índia, mas os dois países aceitam a proposta

GENEBRA - Pressionada a abrir seu mercado agrícola, a União Européia (UE) tenta dividir o G-20, grupo formado por Brasil, Índia, China e outros países emergentes, às vésperas da conferência da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Hong Kong, a partir do dia 13. Neste fim de semana, o comissário de Comércio da UE, Peter Mandelson, propôs um corte de tarifas com o potencial de rachar o G-20, mas a Índia e o Brasil evitaram o êxito da manobra. A proposta de Mandelson é elevar o corte das tarifas agrícolas mais altas para 70%. Antes, havia proposto 60%. Os demais países teriam de fazer o mesmo. Esse corte interessa ao Brasil, mas muitos países do G-20 são importadores de alimentos e um corte maior significaria problemas para a agricultura.

Mandelson esperava que o Brasil acatasse a proposta e os indianos a rejeitassem, mas, em vez disso, os dois países indicaram que a aceitariam. Segundo o governo indiano, ao aceitar flexibilizar suas posições, Índia e Brasil mantiveram a unidade e a pressão sobre os europeus. O governo dos Estados Unidos se apressou em emitir uma nota para saudar "a determinação de Brasil e Índia de contribuir para as negociações".

O fim de semana foi repleto de reuniões entre ministros relacionadas à OMC. No sábado, em Londres, os ministros das Finanças dos Estados Unidos, do Reino Unido e o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, acertaram os ponteiros para pressionar a UE a abrir seu mercado agrícola.

Em Genebra, além do encontro com os europeus, indianos, australianos e japoneses, o chanceler brasileiro, Celso Amorim, esteve reunido na noite de sábado com o representante de Comércio da Casa Branca, Rob Portman, para também estabelecer uma estratégia de pressão sobre os europeus nos próximos dias, até o encontro de Hong Kong.

Amorim disse que falou várias vezes, por telefone, com Palocci, durante as reuniões. "Estamos 100% coordenados', disse Amorim. Assim como fez Amorim em Genebra, na capital britânica Palocci acenou com a possibilidade de o Brasil fazer concessões na área de produtos industriais e serviços, se conseguir algo concreto na agricultura.

A Oxfam não viu a oferta com bons olhos e se diz "seriamente preocupada" que o Brasil tenha sentido a necessidade de fazer concessões para conseguir algo no setor agrícola. Para a entidade, os países ricos prometeram abrir o setor agrícola há quatro anos e devem fazer isso sem exigir nada em troca.

A conferência de Hong Kong deveria fechar um entendimento sobre os cortes de tarifas e de subsídios, mas acabará vendo apenas avanços limitados. Para muitos negociadores, a culpa é da Europa, que não aceita abrir seus mercados para produtos agrícolas. O Brasil quer pelo menos uma data para a eliminação dos subsídios às exportações agrícolas.