Título: Candidato a diplomata já não precisa saber inglês
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/01/2005, Nacional, p. A7

Desde o início do governo Luiz Inácio Lula da Silva, a carreira diplomática passou por várias mudanças polêmicas, paralelamente ao novo foco da política externa. A última veio em dezembro passado, quando a prova de inglês deixou de ser eliminatória para o ingresso na carreira diplomática, passando apenas a contar pontos, como ocorre com o francês e espanhol. A justificativa para a portaria, diz o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, é remover um "fator elitista". A decisão foi tomada apesar de a cúpula do Itamaraty estar ciente de que a maioria das negociações políticas, econômicas e comerciais que envolvem o País - salvo aquelas no âmbito da América do Sul e da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) - transcorre em inglês. Da mesma forma, boa parte dos contatos das representações estrangeiras com o Itamaraty, em Brasília, se dá nesse idioma.

"Essa é uma decisão democratizante", insistiu ontem o chanceler Amorim, um negociador afiado no inglês e no francês. "Prefiro um diplomata que conheça bem o português e a história do Brasil a outro que saiba falar bem o inglês. Qualquer um pode aprender uma língua em três anos."

Amorim argumentou que a preservação do inglês como matéria eliminatória no exame para o ingresso ao Instituto Rio Branco (IRB), dedicado à formação dos diplomatas, tendia a favorecer candidatos de classes mais abastadas e filhos de diplomatas. Para ele, o importante é que o funcionário tenha domínio do idioma antes de assumir seu primeiro posto no exterior, o que indica que caberá ao IRB investir mais no ensino do idioma.

O porta-voz do Itamaraty, Ricardo Neiva Tavares, agregou que o novo processo de seleção abre o leque para que candidatos de todas as regiões do País possam competir com chances de ingresso no ministério. Ele lembrou que o IRB e a própria carreira se encarregam de formar o bom diplomata. Por fim, argumentou que, ao longo dos 60 anos do IRB, houve períodos em que os exames de idiomas não eram eliminatórios.

CRESCIMENTO

Nos últimos dois anos, várias outras iniciativas de Amorim e do secretário-geral das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, causaram rebuliço entre os diplomatas. Mas poucas vingaram.

No início de 2003, a cúpula do Itamaraty, apoiada pelo assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, pretendia aumentar o número de diplomatas de 997 para 1.400 até o final de 2006.

Segundo Tavares, dificilmente essa meta será cumprida. Hoje, há 1.122 funcionários, o que equivalente ao quadro de 25 anos atrás - apesar do aumento de áreas no ministério e de postos no exterior.

A idéia de forçar os oficiais de chancelaria a passar por um exame de inglês, como pré-requisito para assumirem postos no exterior, caiu por decisão judicial no ano passado. Da mesma forma, o projeto de Pinheiro Guimarães de criar uma carreira mais rápida acabou na gaveta, depois de consultas aos diplomatas no início de 2004.

A determinação de que os jovens diplomatas teriam de, obrigatoriamente, embarcar para um país sul-americano como primeiro posto no exterior vigorou apenas por um ano.

Das novas idéias, restou a norma que obriga os diplomatas que serão transferidos ao exterior e os que retornam ao Palácio Itamaraty, em Brasília, a ler três livros. A leitura se dá na sala ao lado da de Pinheiro Guimarães, que depois os submete a uma sabatina oral.

Escolhida pelo secretário-geral, a bibliografia é composta por Brasil, Argentina e Estados Unidos, de Moniz Bandeira, com prefácio do próprio Pinheiro Guimarães, Pensamento Econômico Brasileiro, de Ricardo Bielschowsky, e Biografia do Barão de Rio Branco, de Álvaro Lins.