Título: Vinte anos depois, PT quer reintegrar deputados que votaram em Tancredo
Autor: Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/01/2005, Nacional, p. A8

O presidente do PT, José Genoino, vai convidar os ex-deputados Airton Soares, Bete Mendes e José Eudes, afastados do PT em 1985 por terem votado em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, a retornarem ao partido. E vai pedir ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que à época foi contra a expulsão, que seja avalista das fichas partidárias dos três. Vinte anos depois da eleição que elegeu Tancredo Neves, o PT emerge como principal beneficiado pelo sistema político derivado do fim do regime militar. A despeito dessa decisão com cheiro de corajosa revisão histórica, Genoino diz que a decisão do PT de não votar em Tancredo no Colégio Eleitoral foi correta: "O papel do PT era tensionar". Naquela primeira semana de janeiro de 1985 o PT fez uma convenção em Diadema e decidiu que nenhum parlamentar do partido poderia votar em algum candidato no Colégio Eleitoral.

No dia 15 de janeiro de 1985, três dos oito deputados da escassa bancada federal do PT votaram em Tancredo Neves. Os três - Airton Soares (de São Paulo), José Eudes e Bete Mendes (ambos do Rio de Janeiro) - foram estigmatizados pelo partido e pediram desligamento antes que a expulsão fosse concretizada.

Na convenção de Diadema, dois líderes do partido foram contra a expulsão dos que votassem no Colégio Eleitoral - Lula e José Genoino. Lula manteve sua posição dura contra o voto no candidato oposicionista. "Com Tancredo", disse ele à época , "fica tudo como está." Mas Genoino reagiu à decisão: "É um grave erro político", denunciou à saída da convenção. Em outubro de 1984 Airton Soares renunciou à liderança do PT, mas a bancada não aceitou seu pedido. Em dezembro, afinal, entregou o cargo ao vice-líder José Genoino.

"A redemocratização ensinou a todo mundo", avalia Genoino hoje, reconhecendo que os últimos vinte anos construíram "um processo surpreendente". Ele admite que poucos partidos foram tão beneficiados pela redemocratização como o PT. Diz que o PT contribuiu para o processo e aprendeu com ele: "Foi dialético", arremata numa conclusão típica da esquerda.

Embora com uma ênfase apenas relativa, Genoino insiste em defender a posição do PT em 1985: "Nas circunstâncias da época, foi uma posição correta. Para se viabilizar o PT tinha de se colocar à esquerda", argumenta. E menciona que a base do PT "era maior que o Colégio Eleitoral" e que foi fundamental para enriquecer o processo "o tensionamento no limite" provocado pelo PT.

Ele descarta que o PT tenha facilitado o risco de ver Paulo Maluf ganhar a eleição. À época, Lula desdenhou dessa possibilidade com um sofisma: ele dizia que Tancredo Neves não teria renunciado ao governo de Minas Gerais para concorrer à presidência da República "se dependesse de oito votos" (a bancada do PT).

Hoje Genoino elogia o processo que redundou daquela votação no plenário da Câmara dos Deputados. "A transição pactuada consolidou a democracia", reconhece ele. E interpreta o que aconteceu de lá para cá: o Brasil se modernizou e o desenvolvimento econômico projetou a esquerda para integrar o processo político como protagonista. "Até então, os grandes movimentos da política nunca tinham favorecido a democracia de massas", observa.