Título: Vale aumenta minério, mas não quer repasse para aço
Autor: Irany Tereza
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/01/2005, Economia, p. B4

RIO - O eventual impacto inflacionário em 2005 causado pelo aumento do preço do aço, um dos principais vilões da inflação no ano passado, iria refletir pressão de demanda e não de insumos, na opinião do diretor de Planejamento da Companhia Vale do Rio Doce, Gabriel Stoliar. Ele sustenta que não há razão para repasse do reajuste que está sendo negociado para o minério de ferro, previsto em 90%. "Se a siderurgia transferir para o minério 10% do ganho de margem que teve nos últimos meses, já dá esse porcentual", diz. A Vale não pretende abrir mão do reajuste substancial este ano. Stoliar lembra que em 2001, já vivendo o boom da China, o preço do minério caiu 2,4%, devido ao mau desempenho do setor siderúrgico. "De 2002 para 2003, a siderurgia acumulou dinheiro, ganhou fôlego, havia espaço para um reajuste até maior do minério do que o que efetivamente ocorreu, de 5%", afirma. Segundo ele, o desempenho de 2003 para 2004 foi mais espetacular ainda. "Tivemos um reajuste recorde do minério de 19%, mas foi muito abaixo do que o mercado podia pagar e uma prova disso é que a demanda continuou mais forte do que a oferta." Já 2004 foi o mais brilhante ano para o aço, em sua opinião. "Se aumentarmos o preço do minério em 90% será um mero ressarcimento do que já foi ganho pela siderurgia", diz o executivo.

De acordo com levantamento do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS), apresentado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva há duas semanas, nos últimos 10 anos o reajuste do aço variou entre 145% e 397% e ficou, na média, em 301%. Os insumos usados em sua produção aumentaram entre 354% (minério) e 668% (carvão), uma média de 527%.

O encontro, no último dia 14, reuniu os principais executivos setor siderúrgico e os ministros Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento) e Antonio Palocci (Fazenda), que falou sobre o temor da pressão inflacionária que pode causar a alta contínua dos preços do aço, principal insumo de indústrias como as de eletrodomésticos, automóveis e bens de capital.

Para o economista André Braz, da Fundação Getúlio Vargas, não há como medir o impacto que um aumento de 90% no minério pode causar nos demais preços. "Mesmo que haja elevação dos preços no atacado, o reajuste para o consumidor nem sempre vem e, quando o repasse ocorre, é em intensidade bem menor."

A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) divulgou nota ontem afirmando temer as conseqüências de uma nova escalada dos preços do aço nos custos da cadeia automotiva.

Segundo a entidade, o fenômeno põe em risco as vendas no mercado interno, a competitividade das exportações e afeta a economia como um todo. "Uma forte elevação dos preços do minério de ferro nos fornecimentos internacionais é uma ameaça a setores industriais consumidores de aço, principalmente o automotivo, e também ao consumidor final, cuja renda não acompanha aumentos distanciados de seu poder de compra", diz a nota.