Título: Custo leva ceramistas a desistir do gás natural
Autor: Agnaldo Brito
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/12/2005, Economia & Negócios, p. B6

O pólo ceramista de Santa Catarina fez as contas e tomou uma decisão: iniciar um lento retorno ao passado. Desde o fim da década de 90, acreditou e investiu milhões de dólares em equipamentos e tecnologia para queimar gás natural em fornos, além de usar o combustível em partes do processo industrial. A noção de combustível do futuro trombou com um problema insolúvel: preço. A Cecrisa, uma das maiores indústrias de cerâmica do País, com produção anual superior a 30 milhões de metros quadrados, deu a largada para abrir mão do gás natural. Vai investir na produção de gás a partir do carvão e da turfa, um combustível fóssil farto no Brasil.

Dic Freire, responsável pelos projetos energéticos da Cecrisa, já comemora o resultado dos primeiros testes da unidade piloto de gaseificação. "Com o resultado obtido nessa instalação, vamos redesenhar o projeto para aplicar em escalas maiores em outras fábricas. O objetivo é deixar o gás natural", diz Freire. O investimento em 11 gaseificadores consumirá R$ 15 milhões.

MAIS BARATO

Segundo José Zimmermann, diretor de Operações da Cecrisa, 60% da demanda de energia da empresa é abastecida pela concessionária de gás natural de Santa Catarina, a SC-Gás. Com os novos aumentos do gás aplicados pela Petrobrás, a diferença de preços entre os dois energéticos tornou a situação insustentável. "Em outubro, o custo que a Cecrisa pagou por gigacaloria consumida de gás natural chegou a R$ 81, enquanto o de carvão ficou em R$ 14", compara.

A diferença é tão grande que é capaz até de um senão no plano ambiental, que amparou, no passado, a decisão da empresa de adotar o gás natural no final da década de 90. "Não era o que desejávamos. O gás natural é um insumo muito mais simples de ser usado. O gaseificador, pelo contrário, requer uma nova unidade industrial e isso exige cuidados, mas a diferença de preço é muito elevada", diz Zimmermann.

A mudança da Cecrisa é mais simples. A empresa havia decidido, desde o início da oferta de gás natural, não usar o insumo em todos os processos industriais. Da demanda total, 45% era e continua a ser atendida pelas carboníferas. Carvão usado para produzir vapor, que seca a argila utilizada na produção de placas cerâmicas.

"Creio que a indústria cerâmica abandonará primeiro o gás natural utilizado para os secadores. O investimento em gaseificadores de carvão e turfa dependerá dos resultados", avalia.

Murilo Bortoluzzi, presidente da Associação Sul-Brasileira de Cerâmica para Revestimento, acha que a decisão é um retrocesso, mas vale, nesse caso, a garantia de competitividade de um setor que exportou US$ 327 milhões em 2004.

A indústria carbonífera gosta desse movimento das cerâmicas e quer lançar, em breve, um projeto para dominar a tecnologia de gaseificação. "A Cecrisa saiu na frente, mas o conhecimento que a empresa terá com o próprio desenvolvimento não será repassado para o concorrente. O setor do carvão fará esta oferta", diz Fernando Zancan, do Sindicato das Carboníferas.