Título: Delcídio sugere a Lula que leia relatório da CPI
Autor: Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/12/2005, Nacional, p. A6

Presidente da comissão diz que seria importante o governo se informar sobre os fortes indícios da existência do mensalão

BRASÍLIA - No dia seguinte à divulgação do relatório parcial que apontou os quatro caminhos do mensalão, esquema de pagamento a deputados para reforçar a base aliada e votar matérias de interesse do governo, o presidente da CPI dos Correios, senador Delcídio Amaral (PT-MS), deu uma sugestão ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva: ler o relatório. Lula tem insistido que nada foi comprovado sobre a mesada dos deputados. O presidente já disse várias vezes que há muitas acusações sem provas e que injustiças estão sendo cometidas, embora evite atacar diretamente as duas comissões em andamento no Congresso.

Com o cuidado de quem é responsável por contornar os freqüentes confrontos entre oposicionistas e governistas na CPI, Delcídio diz que "são muito fortes" os indícios da existência do esquema milionário comandado pelo empresário Marcos Valério Fernandes de Souza e que o governo deveria se informar sobre o que já foi investigado até agora.

"Seria importante que o presidente tomasse conhecimento, lesse o relatório, porque as informações são relevantes", afirmou Delcídio ontem, pouco antes de embarcar para seu Estado.

O senador tem esperança na recuperação do PT, apesar de reconhecer que os danos para o partido foram grandes e diz que ainda falta ampliar bastante a investigação sobre a origem dos recursos que abasteceram o esquema montado por Marcos Valério e pelo ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares.

Para Delcídio, as aplicações financeiras dos fundos de pensão podem ser "a chave" para apontar mais uma fonte do valerioduto. Estudo preliminar mostrou que os fundos tiveram perda de R$ 729,1 milhões e a CPI investiga se houve operações casadas para que, na outra ponta, investidores lucrassem e desviassem parte do lucro para esquema de distribuição a políticos, partidos e campanhas eleitorais.

O senador garante que tudo o que for apurado e comprovado pela CPI estará no relatório final, a ser apresentado até abril, sem poupar governos ou pessoas.

"A CPI vai dar a resposta que a sociedade espera", prometeu.

O presidente Lula tem insistido que não há provas do mensalão. Depois do relatório parcial da CPI dos Correios, que diz exatamente o contrário, o senhor acha que ele vai mudar de opinião?

Seria importante que o presidente tomasse conhecimento de que os indícios são muito grandes. Seria importante que ele se inteirasse, que lesse o relatório, porque as informações são relevantes. O relatório é muito forte. O presidente, ou a Casa Civil, poderia tomar conhecimento.

O senhor chamou atenção para o ponto de vista do relator Osmar Serraglio. Mas o senhor concorda que houve mensalão?

É muito difícil negar a tese de que houve o mensalão. Existem as trocas de partido, os saques, as ligações com as corretoras. É uma somatória de operações que torna os indícios muito importantes.

A CPI vive um momento de tensão entre oposicionistas e governistas. Os parlamentares do PT reclamam que o PSDB e o governo Fernando Henrique Cardoso estão sendo poupados. Há risco de se criar um impasse?

Tudo que foi investigado e comprovado estará no relatório final. A comissão parlamentar de inuérito vai dar a resposta que a sociedade espera. A sociedade está nos cobrando.

O dano para o PT foi maior do que para todos os outros partidos. Seu partido vai se recuperar?

Claro que vai se recuperar. Vai ter que ter humildade e equilíbrio, mas vai passar por isso. A vida continua.

Quais são os próximos passos da CPI?

Estamos usando um programa de computador, chamado I2, que fez avançar muito a investigação. Ele faz cruzamentos de nomes, de ligações telefônicas, de movimentações financeiras. Ainda é preciso apurar melhor alguns pontos que não foram incluídos no relatório, principalmente a questão dos fundos de pensão. As operações dos fundos no mercado financeiro podem ser a chave para chegar na origem dos recursos.