Título: Cartéis sofisticam métodos de pressão
Autor: Isabel Sobral
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/01/2006, Economia & Negócios, p. B6

BRASÍLIA - Aumentou a preocupação no País de coibir os acertos entre empresas que impedem a livre concorrência, os chamados cartéis. Em 2005, dos 15 processos mais importantes abertos pela Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, nove são investigações de suposta formação de cartel, informou o titular da secretaria, Daniel Goldberg. Em 2003, foi aberta apenas uma apuração de possível cartelização. Para o secretário, contudo, não são os números que melhor traduzem a evolução do combate aos cartéis, mas os tipos de casos abertos pela SDE.

¿As novas técnicas investigativas implementadas trouxeram para a SDE tipos de cartéis ao quais nem se tinha acesso antes, porque não conseguíamos descobrir¿, resume Goldberg. Os acertos mais comuns hoje vão além da fixação de reajustes ou preços semelhantes para os produtos, e chegam à pressão exercida sobre fornecedores de matérias-primas visando igualar custos e à criação de dificuldades à entrada de novos competidores.

Para provar as práticas anticompetitivas, desde 2003, a secretaria passou a fazer busca e apreensão nas empresas suspeitas, interceptações telefônicas, e a usar a tecnologia da informação nas investigações. Tudo em parceria com o Ministério Público Federal e com a Polícia Federal, com autorização judicial. ¿A SDE se tornou uma agência de investigação econômica ativa que pode investigar certas coisas que antes só se fazia se elas chegassem até a secretaria¿, acrescenta. Concluída a investigação, é o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) quem julga os processos. A prática de cartel pode ser punida com multas entre 1% e 30% do faturamento anual das empresas.

CONSUMIDOR

Esse ¿viés policial¿ na defesa da concorrência no País tem o apoio dos especialistas. ¿Para os empresários e investidores estrangeiros, por exemplo, é muito positivo que os órgãos governamentais estejam mais vigilantes à questão da concorrência¿, diz o consultor Rui Coutinho, ex-presidente do Cade e ex-titular da SDE. Uma das falhas históricas no combate aos cartéis, destaca, é a dificuldade de produzir provas contra eles.

Para Coutinho, os cartéis são ¿a forma mais perversa¿ de prejuízo à economia e aos consumidores. Um dos casos recentes em investigação recai sobre grandes frigoríficos. A denúncia, apresentada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), sustenta que haveria uma tabela preestabelecida pelos donos de frigoríficos para adquirir a carne vendida pelos produtores.

¿Na ponta final de tudo, há uma manipulação dos preços aos consumidores", diz Coutinho, que assessora a CNA no processo. A investigação na SDE foi aberta em agosto, mas ainda não há data para o caso ir à julgamento. Um caso encerrado no ano passado pelo Cade, com a condenação das empresas, foi o conhecido como Cartel das brita, o primeiro da era policial da SDE. Na apuração contra as indústrias fornecedoras de pedras e brita para a construção civil, houve busca e apreensão, trabalho de informantes, fotos e escutas telefônicas. ¿Foi um ano de trabalho para concluir toda a operação e quase nos concentramos só nisso¿, relata Goldberg.

Um levantamento do advogado Mauro Grimberg, ex-conselheiro do Cade, revelou que das 45 condenações por prática de cartel impostas pelo Cade entre 1999 e 2005, 32 são do setor de serviços, envolvendo hospitais e associações de saúde ou médico, contadores, agentes de viagem, transporte urbano. ¿"Não acho que nesses setores haja simplesmente mais cartéis, mas é que neles é mais fácil ser descoberto e provado o conluio¿, opina o jurista. Para Goldberg, os empresários brasileiros estão mais conscientes dos riscos de fazer cartel. ¿Por isso, aqueles que insistem, fazem cartéis ainda mais sofisticados.¿