Título: 'Não é hora de relaxar a política fiscal', adverte diretor do FMI
Autor: Fabio Graner e Gustavo Freire
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/01/2006, Economia & Negócios, p. B6

A solenidade de ontem no Palácio do Planalto para formalizar o pagamento antecipado de US$ 15,5 bilhões ao Fundo Monetário Internacional (FMI) foi marcada pela defesa da continuidade do programa de ajuste fiscal do governo. Os discursos do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e do diretor-gerente do Fundo, Rodrigo de Rato, coincidiram na defesa da manutenção de superávits fiscais (economia para pagar juros da dívida) nos próximos anos. Palocci, na presença da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do presidente Lula, insistiu na tese de dar ao processo de consolidação fiscal uma perspectiva de longo prazo.

Em novembro, Dilma resistiu a esse plano de Palocci. Rodrigo de Rato previu que a economia brasileira deve crescer 4% este ano. Apesar do otimismo, fez um alerta: não se pode relaxar a política fiscal após colher os primeiros frutos.

Lembrou sua experiência como ministro da Economia da Espanha, no período em que o País foi obrigado a ter forte superÁvit para ingressar na comunidade européia.

Rato destacou ¿a conquista do Brasil ao saldar as obrigações financeiras com o FMI muito antes do programado¿. Para ele, isso é motivo de ¿orgulho¿, especialmente pelo fato de há três anos o País ter vivido uma crise de confiança profunda.

¿Três anos fizeram enorme diferença¿, disse Rato, ao reforçar a necessidade de o País não ser tentado a mudar o rumo. ¿Com relação às políticas macroeconômicas, a tarefa é óbvia: manter o curso.¿

Entre os resultados obtidos pelas políticas adotadas no Brasil, Rato destacou o controle da inflação. ¿Desde o início de seu governo, o presidente Lula assumiu o compromisso inquebrantável de manter a inflação sob controle, por conhecer profundamente o impacto da inflação sobre os pobres¿, enfatizou.

Em entrevista coletiva, Rato disse que nos próximos anos o Brasil já poderá ter inflação ¿abaixo de 4%¿ e neste ano deve fechar dentro da meta de 4,5%. O diretor do Fundo elogiou a política monetária, ¿conduzida com perícia e determinação¿.

Segundo ele, a atuação do BC levou ao cumprimento das metas inflacionárias e ¿o elevado grau de transparência do processo decisório também ajudou a reforçar a credibilidade do sistema¿.

Enfatizando a cartilha do FMI, Rato disse que o Brasil deve formalizar a autonomia operacional do Banco Central. ¿Seria muito bom que houvesse progressos no objetivo do governo de dar autonomia ao BC, o que aumentaria a credibilidade do sistema de metas de inflação e abriria espaço para a maior redução da taxa real de juros.¿

Rato também elogiou a melhora nos indicadores de vulnerabilidade externa. ¿As exportações dobraram desde 2002, resultando num superávit em conta corrente que, aliado à retomada das entradas de capital, elevou as reservas internacionais para um nível mais confortável¿, o que permitiu a quitação antecipada, em dois anos, da dívida com o Fundo.

Outro elogio foi para a política fiscal e a decisão do governo de elevar o superávit primário logo que assumiu o comando do País. ¿A política fiscal manteve-se inabalável no objetivo de baixar a dívida pública em relação ao PIB (Produto Interno Bruto)¿, disse.

Para Rato, ¿um fator crucial que pontuou essa reviravolta talvez tenha sido a corajosa decisão de elevar substancialmente a meta de superávit primário, tomada ainda nas primeiras semanas do governo Lula¿. ¿Essa decisão foi fundamental para traçar o rumo das políticas e restaurar a confiança¿, disse ele, ao defender a continuidade dessa política.

¿A maior lição é que não se pode relaxar a disciplina fiscal após colher os primeiros frutos; é preciso, antes, cultivá-la por um longo período, pois os resultados se multiplicam com o tempo.¿ Para ele, nos próximos ¿quatro ou cinco anos¿ a relação dívida/PIB do Brasil pode chegar a 40%.

Rodrigo Rato definiu a nova relação do Brasil com o Fundo como ¿de parceiros¿ e aproveitou para, mais uma vez, reforçar medidas que são defendidas pela instituição, mas não adotadas por Lula.

Ele disse que o País deveria reduzir a rigidez orçamentária, fortalecer o sistema financeiro ¿ ampliando e aperfeiçoando o mercado de crédito e reduzindo o crédito direcionado ¿ e melhorar o ambiente de investimentos.

Rato defendeu a redução das barreiras comerciais, a simplificação dos processos de abertura, a regulamentação de empresas e a garantia de que a legislação trabalhista seja compatível com a expansão do emprego.

Palocci também destacou os resultados obtidos pelo País no governo Lula e reafirmou que não haverá mudança de rumo. ¿Reconhecer que grandes avanços foram feitos não significa negar que muito ainda resta por fazer.

Continuamos e continuaremos envidando esforços no sentido de aprimorar elementos estruturais da economia brasileira¿, disse.