Título: Proposta não existe, diz Tabaré
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/01/2006, Economia & Negócios, p. B4

Presidente uruguaio diz que prioridade é o Mercosul

O presidente do Uruguai, Tabaré Vázquez, esclareceu ao governo brasileiro que seu país não propôs nem pretende negociar um acordo de livre comércio com os Estados Unidos. A mensagem foi enviada ao Itamaraty por seu ministro das Relações Exteriores, Reynaldo Gargano, na quarta-feira, enquanto os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner, da Argentina, conversavam no Palácio do Planalto.

Gargano ressaltou que não há divisões no governo uruguaio sobre o assunto porque a política externa é decidida pelo presidente e o chanceler. "Essas são as vozes que se têm de escutar. As outras são opiniões pessoais", afirmou, segundo o jornal El Observador.

O episódio, para o Itamaraty, não passou de blefe ou de uma "discussão bizantina em ambiente do verão de Montevidéu". Na chancelaria brasileira, há a certeza de que jamais foi esboçado um projeto de acordo e Montevidéu nunca o apresentou a Washington.

Indagado se considerava encerrado o episódio, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disparou: "Existe um episódio? Se houvesse um acordo, teríamos sido avisados. Nunca fomos", afirmou. "Eu concordo integralmente com o presidente Tabaré Vázquez."

Na segunda-feira, ao voltar de férias, Tabaré conduziu a primeira reunião do Conselho de Ministros do ano com o claro objeto de pôr fim às controvérsias em sua equipe sobre o eventual acordo com os americanos, atitude que levaria o país a se retirar do Mercosul.

Tabaré leu o receituário da Frente Ampla, que acentua o Mercosul como uma prioridade para o relacionamento externo do país. Ele disse ainda que o país não celebrará esse acordo com os americanos e se opõe à Alca. E pôs fim à confusão.

Com essa iniciativa, desautorizou seus ministros da Economia, Danilo Astori, da Indústria e Energia, Jorge Lepra, e do Turismo, Héctor Lezcano, os mesmos que haviam se manifestado contra o Mercosul e favoráveis ao acordo com os EUA.

A celeuma chamou a atenção para um dos dilemas varridos para debaixo do tapete desde que o Mercosul entrou em operação, em 1995: os benefícios escassos do bloco para os sócios menores. Até 1999, o Uruguai se manteve quieto, por causa dos ganhos obtidos por seus produtos com a valorização do real. Em 2002, mergulhou com a Argentina em crise econômica.

O Uruguai não cresce há quatro anos, enfrenta um elevado déficit no balanço de pagamentos e tem uma dívida externa próxima de 100% do PIB. O país precisa desesperadamente exportar e atrair investimentos produtivos. Atualmente, de 70% a 80% da produção uruguaia de carne bovina vai para os EUA.