Título: Sindicato de pilotos cobra salários atrasados da Varig
Autor: Mariana Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/01/2006, Economia & Negócios, p. B14

Depois de agüentar atrasos de salário na Varig por quase três anos, o Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA), que representa pilotos e comissários, resolveu agora reclamar. Em correspondência enviada ao presidente da empresa, Marcelo Bottini, a presidente do SNA, Graziella Baggio pede "imediata regularização das pendências" para a "continuidade pacífica" do processo de recuperação do grupo Varig.

Graziella diz que decidiu dar um basta após o atraso de uma parcela do salário de dezembro, prevista para quinta-feira passada. "Os funcionários receberam uma mensagem com a desculpa de que a empresa não poderia pagar pois a BR Distribuidora havia descontado recebíveis", afirma. "Ora, a Varig já sabia que esses recebíveis (no valor de R$ 15 milhões) seriam descontados. Não dá mais para botar a culpa nas estatais pela falta de capacidade de manter o fluxo de caixa." Os trabalhadores não receberam 13 º salário e dezembro só foi pago parcialmente. "A lei de recuperação obriga as empresas a pagar salário em dia", lembra Graziella, que se diz muito "pessimista" com o futuro da companhia.

Fontes ligadas à administração da Varig avaliam, contudo, que a atitude do sindicato não corresponde ao sentimento das bases e que se trata de um posicionamento político. Até o início do ano passado, o SNA mantinha bom relacionamento com a administração da empresa e foi solidário à crise apesar dos atrasos de salário, que viraram rotina a partir de 2002. "Ela está sem discurso e não se conforma que Bottini tenha conseguido apoio dos trabalhadores", rebate uma fonte na empresa.

Desde que assumiu o cargo, em novembro, Bottini intensificou o relacionamento direto com funcionários, com visitas às bases regionais e mensagens de ânimo e poesia no "Diário de Bordo", o jornalzinho eletrônico da presidência. Apelando às emoções da tropa, Bottini conseguiu, em pouco tempo, enorme apoio ao plano de recuperação. Atualmente, ele recebe mais de 200 mensagens por dia de apoio de funcionários.

Além de fundamental em se tratando de uma prestadora de serviço, o apoio dos trabalhadores será importante para o sucesso do novo modelo de estruturação societária, que prevê a criação de Fundos de Investimento e Participação, com a conversão de dívidas e a diluição do controle da Fundação Ruben Berta.

A estrutura dos FIPs está sendo elaborada pela ASM Asset Management e terá de ser aprovada por assembléia de credores no dia 13 de fevereiro. A expectativa da empresa é de que a grande maioria dos trabalhadores converta seus créditos em participação no FIP de Controle. Ainda que o peso dos créditos trabalhistas seja pequeno - algo como R$ 170 milhões, ante um passivo de R$ 7 bilhões -, o apoio dos trabalhadores é importante para a empresa atrair outros investidores. No entanto, para isso se concretizar a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) terá de abrir uma exceção. Pelas normas atuais da CVM, apenas investidores qualificados e com créditos superiores a R$ 300 mil podem converter dívidas em ações de FIPs. A Varig já fez uma consulta à CVM, que diz estar estudando a questão.

A Varig também aguarda a publicação, no Diário Oficial, da decisão judicial, favorável à ela, relativa à ação indenizatória movida contra o governo por perdas em planos econômicos. A indenização é estimada em R$ 4,5 bilhões. Se a decisão for publicada antes da data de criação dos FIPs, poderá torná-los mais atraentes. "A criação dos FIPs será o principal teste a ser enfrentado pela companhia", afirmou a juíza titular da 2ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, Márcia Cunha, uma das responsáveis pelo caso Varig.

De acordo com a consultoria Delloite, administradora judicial da empresa, a situação do fluxo de caixa da Varig caminha para a "normalidade". No auge da crise, a empresa chegou a operar com US$ 60 milhões mensais negativos.