Título: TV digital: Japão tem US$ 500 mi para emissoras
Autor: Renato Cruz e Ana Paula Lacerda
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/03/2006, Economia & Negócios, p. B10

Para convencer o governo a aceitar o seu padrão de TV digital, os japoneses fizeram uma oferta para agradar principalmente aos radiodifusores. Os detentores do padrão ISDB, defendido pelas grandes emissoras, ofereceram US$ 500 milhões em financiamento para que as empresas de TV façam a transição do analógico para o digital. Os recursos são do Japan Bank for International Cooperation (JBIC). "Se a demanda for maior, haverá mais recursos", garantiu Murilo Pederneiras, consultor do padrão japonês ISDB no Brasil.

Segundo ele, a proposta já foi entregue ao governo. Os japoneses não ofereceram outros itens com valores definidos, além do financiamento às emissoras. "O investimento dos fabricantes de televisores virá naturalmente", disse o consultor. Não só os japoneses, mas também os fabricantes originários de outros países terão de investir em novas linhas de produção para aparelhos digitais. O ISDB não se comprometeu a instalar uma indústria de semicondutores no Brasil, segundo ele. "O que nos comprometemos é a fazer um estudo de viabilidade em conjunto."

O Japão aceitou incorporar parte do trabalho desenvolvido pelos grupos de pesquisa do Sistema Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD), que reuniu universidades e institutos de pesquisa do País. Eles vão aceitar o MPEG-4, tecnologia internacional de compressão de vídeo, como parte de seu padrão, como foi sugerido pelos brasileiros. Os japoneses também concordaram em integrar o middleware (software que funciona como sistema operacional) e os aplicativos desenvolvidos no Brasil ao seu padrão. Também ofereceram zerar os royalties.

"A opção por um padrão não significa adotar um padrão fechado", afirmou Augusto Gadelha, secretário de Política de Informática do Ministério da Ciência e Tecnologia. "Queremos fazer inovações, inclusive as sugeridas pelos consórcios de pesquisa." Mas é verdade que o governo já decidiu pelo padrão japonês? "Não é verdade ainda", respondeu Gadelha. Pederneiras, do ISDB, afirmou não ter ouvido de nenhum interlocutor do governo que a decisão já estivesse tomada. Apesar disso, disse estar "bastante confiante" e esperar que a decisão saia amanhã ou, no máximo, segunda-feira.

Enquanto os japoneses acenam com US$ 500 milhões para financiar as emissoras brasileiras, os europeus oferecem 400 milhões do Banco Europeu de Investimentos. Além disso, 100% dos royalties seriam reinvestidos em pesquisa e desenvolvimento e a União Européia baixaria a zero a taxa de importação de TVs produzidas no Brasil.

O principal argumento a favor da Europa foi que o Brasil não ficaria dependente de poucos fornecedores de equipamentos. "O padrão europeu é o mais usado no mundo e existirá uma gama de fornecedores, o que propicia a competição. Se o Brasil escolher o padrão japonês, ficará dependente de poucos fornecedores, sediados em um país cujo mercado nada tem a ver com o Brasil", disse o diretor de Tecnologia da Siemens, Mario Baumgarten.

Claudio Raupp, vice-presidente de Celulares da Nokia e integrante da DVB,afirmou que a empresa não terá interesse de produzir celulares que transmitam o padrão japonês no Brasil. "No Japão, não se usa GSM. Teria de ser feito um modelo só para o Brasil, diferente do usado no resto do mundo."

O padrão europeu foi mostrado em diversas aplicações. "Havia boatos de que o DVB não seria capaz de se adaptar a middleware nacional ou não conseguiria transmitir em alta definição, em definição padrão e para portáteis no mesmo canal. Hoje demonstramos que não é verdade", disse Baumgarten. Ele e Magalhães afirmaram que têm informações do governo de que nada foi decidido.