Título: Portugal pede demissão após saída de Palocci
Autor: Lu Aiko Otta e Beatriz Abreu
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/03/2006, Nacional, p. A12

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva escolheu Guido Mantega para o Ministério da Fazenda por causa da amizade pessoal e da lealdade. A escolha, porém, começou ontem a gerar efeitos inesperados e corre o risco de desencadear "operação desembarque"da equipe econômica.

A primeira deserção foi do secretário-executivo da pasta, Murilo Portugal, o "doutor No". Horas depois da saída de Antonio Palocci, ele entregou a Lula carta de demissão "em caráter irrevogável" e não cedeu aos apelos para que ficasse.

Embora tenha ocupado postos estratégicos no governo Fernando Henrique Cardoso, Portugal ganhou a confiança de Palocci. No início, ciceroneou o então ministro em contatos com a comunidade financeira internacional. Palocci até pensou em nomeá-lo para o Banco Central, mas Portugal preferiu ficar no Fundo Monetário Internacional (FMI), onde era o representante do Brasil. Só no ano passado, em meio à crise envolvendo o presidente do BC, Henrique Meirelles, Portugal concordou em transferir-se para Brasília, para ficar como "reserva" para o posto.

Também demitiu-se o assessor especial de Palocci, Marcelo Amorim Netto. Apontado como um dos suspeitos pelo vazamento dos dados bancários do caseiro Francenildo Costa, Netto diz em sua carta que, por ocupar um cargo de "caráter estritamente pessoal e de confiança", pedia demissão.

Também é dado como certo que o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, deixará o governo. Sua saída já era quase uma certeza desde o final do ano passado, quando recebeu convite para ocupar uma vice-presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O convite ainda existe, segundo informaram fontes do banco ao correspondente do Estado em Washington, Paulo Sotero.

Com a vinda de Mantega para a Fazenda, Levy tem mais razões para sair. Os dois se envolveram em discussões em torno da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) e sobre a política fiscal. Junto com Levy, deve deixar o governo seu adjunto, José Antônio Gragnani, que ocupa posição estratégica, sendo o responsável pela gestão da dívida pública brasileira. Para seu lugar, deverá ser recrutado um operador de mercado.

Nos bastidores, o comentário era que outros secretários que chegaram junto com Palocci também consideravam a hipótese de colocar seus cargos à disposição.

A chegada de Mantega, contundente crítico da condução da política monetária, deverá provocar também mudanças no BC. É pouco provável que o diretor de Política Econômica, Afonso Bevilaqua, apontado como o líder da ala conservadora da diretoria do banco, permaneça. É também o caso do diretor de Assuntos Internacionais, Alexandre Schwartsman. Há dúvidas quanto à permanência do presidente, Henrique Meirelles.