Título: Troca de comando no CNJ
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/04/2006, Notas e Informações, p. A3

Com a aposentadoria do ministro Nelson Jobim, que decidiu dar tempo integral à política, as atenções agora se voltam para a ministra Ellen Gracie, que o substituiu na presidência do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Como ela está na magistratura há quase duas décadas e sempre manteve a coerência doutrinária em seus votos desde que foi nomeada para a mais alta corte do País, em 2000, os profissionais do direito sabem o que dela esperar à frente do STF. A dúvida é com relação ao comportamento que a ministra adotará na chefia do CNJ, pois este é um órgão novo na história do Judiciário e os limites de sua atuação ainda não estão bem definidos.

O CNJ foi criado em dezembro de 2004 pela Emenda Constitucional (EC) 45 para promover o controle externo de todas as cortes do País e começou a funcionar três meses depois, sob forte resistência de alguns setores da magistratura. Ela foi tão intensa que, em abril de 2005, o STF rejeitou uma ação direta de inconstitucionalidade impetrada por entidades de juízes, que pediam a extinção do CNJ. A substituição de Jobim pela ministra Ellen Gracie é a primeira alteração na composição do órgão.

Desde o início, o CNJ suscitou várias polêmicas nos meios forenses, por dedicar suas primeiras iniciativas a quatro medidas moralizantes impostas sob a forma de resoluções e portarias. Na época, vários conselheiros alegaram que, para ganhar autoridade no âmbito do Judiciário, o órgão precisaria adquirir respeitabilidade junto à opinião pública.

Tomada em 2005, a primeira decisão do CNJ foi exigir de todas as cortes do País o fim das férias coletivas. Embora essa medida tenha sido determinada pela EC 45, vários tribunais se recusaram a cumpri-la, afirmando que ela não tinha aplicação imediata. Também imposta no ano passado, a segunda decisão do órgão foi determinar que a promoção de juízes por merecimento deveria ser aberta e fundamentada, para evitar favorecimentos.

As outras duas decisões foram tomadas este ano. Uma delas foi a proibição da contratação de parentes de magistrados - o nepotismo judicial - para ocupar cargos de confiança e funções comissionadas no Judiciário. A outra decisão foi a imposição de um teto salarial para a magistratura. Os magistratados atingidos por essas medidas divulgaram contundentes manifestos contra Jobim e acusaram o CNJ de exorbitar de suas prerrogativas, legislando por meio de simples resoluções e desprezando a autonomia dos tribunais, assegurada pela Constituição.

Foi nesse clima de forte oposição de parte da magistratura contra as medidas moralizadoras do CNJ que Ellen Gracie assumiu a presidência do órgão, na quinta-feira. De lá para cá, ela já tomou duas decisões. A primeira foi declarar que o Conselho "entrará numa fase mais dedicada à sua atividade-fim", concentrando seus esforços para aumentar a eficiência financeira e gerencial dos tribunais. Entre as providências a serem tomadas, destacam-se a unificação dos bancos de dados da Justiça e a autorização para que os tribunais negociem com os bancos, mediante licitação, melhores taxas para a gestão dos depósitos judiciais. Somados, eles totalizam R$ 17,5 bilhões e recebem uma remenuração inferior à de mercado.

A segunda decisão tomada pela ministra Ellen Gracie foi reduzir ao mínimo as matérias a serem decididas pelo plenário do CNJ, em cujo âmbito os representantes da magistratura vinham se opondo de forma cada vez mais belicosa aos conselheiros oriundos da advocacia e do Ministério Público. Para reduzir a tensão, a ministra distribuiu as matérias em cinco comissões temáticas.

Evidentemente, ainda é cedo para saber se ela se afastará ou não da linha adotada por seu antecessor. É inegável que, dada a repercussão alcançada por suas medidas moralizantes, o CNJ se consolidou na opinião pública.

Mas também é certo que, para cumprir o importante papel para o qual foi criado, ele não poderia continuar funcionando sob a renitente acusação de estar exorbitando de suas prerrogativas. Nesse sentido, as providências adotadas pela ministra Ellen Gracie para reduzir as tensões parecem sensatas. Resta agora esperar que elas produzam os resultados esperados.