Título: Lula e Evo: amigos, mas negócios à parte
Autor: Raquel Massote e Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/04/2006, Economia & Negócios, p. B6

O brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, o boliviano Evo Morales e o venezuelano Hugo Chávez têm em comum o fato de serem líderes populares de esquerda e terem em seu território reservas de petróleo e gás. Do ponto de vista político, eles se apóiam mutuamente. Do ponto de vista econômico, porém, a história é outra. O relacionamento de Lula com Evo está cada vez mais distante da parceria que estabeleceu com Hugo Chávez.

Nos últimos três anos, Lula e Chávez desenvolveram projetos em conjunto, como a refinaria que a estatal venezuelana de petróleo, a PDVSA, vai construir em Pernambuco. Eles também firmaram, junto com o argentino Néstor Kirchner, uma parceria estratégica cujo principal projeto é um gasoduto que trará ao sul do continente o gás natural das reservas venezuelanas. Quando concluído, o investimento deixará toda a região menos dependente do fornecimento a partir da Bolívia.

A cooperação entre Lula e Chávez se estende a outros níveis. Eles são os principais fiadores da criação da Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa). O relacionamento entre os dois é descrito por assessores como positivo e há uma certa simbiose entre ambos. Chávez respeita as opiniões de Lula, pois sabe que o brasileiro é um ponto de equilíbrio no relacionamento das esquerdas sul-americanas com a comunidade internacional.

RISCO

Lula e Chávez apoiaram a candidatura de Evo Morales à presidência da Bolívia, o que se mostrou uma estratégia de resultado duvidoso para o Brasil. É certo que a Lei de Hidrocarbonetos, que nacionaliza as reservas de petróleo e derivados na Bolívia, foi aprovada pelo Congresso antes da eleição de Evo Morales. Porém, na época em que tramitava no Congresso boliviano, Morales liderou a pressão popular em favor da lei. Agora, cabe a ele regulamentá-la. E o risco - segundo se comenta nos bastidores do governo brasileiro - é que a regulamentação da lei saia mais radical do que seria caso um candidato mais moderado tivesse sido eleito.

O relacionamento entre Lula e Morales ainda é uma incógnita para os observadores do lado brasileiro. Uma parceria nos moldes da existente com Chávez é, porém, dificultada pela imagem que o Brasil tem na Bolívia. Lá, o País é tido como uma grande potência imperialista. O líder indígena pode ter dificuldades de se aproximar demais do presidente brasileiro.