Título: Brasil precisará comprar mais gás boliviano
Autor: Raquel Massote e Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/04/2006, Economia & Negócios, p. B6

A decisão do governo boliviano de mudar as regras de exploração de gás natural é uma péssima novidade para o Brasil. Está previsto no planejamento: a partir de 2008, o País terá de comprar mais gás. Além dos 30 milhões de metros cúbicos por dia que hoje fluem em direção ao Brasil, será preciso importar mais 4 milhões de m3/dia em 2008 e elevar o volume para mais 15 milhões m3/dia em 2009. Os números são da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás).

Até lá, a Bolívia terá de ser a responsável, segundo previsão, pelo abastecimento de 50,61% da demanda das Regiões Sul e Sudeste do Brasil e de 40,72% da necessidade nacional, revelam números das distribuidoras. O problema talvez não seja a disponibilidade de oferta, mas as condições comerciais que justifiquem a expansão do Gasbol.

"Uma conseqüência dessa nacionalização parece evidente. A Bolívia vai avançar nas margens de lucro da Petrobrás e, provavelmente, a estatal vai transferir esse aumento de custo aos consumidores no Brasil", afirma Sérgio Bajay, pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético da Universidade Estadual de Campinas (Nipe/Unicamp). Mas há limites para isso. "O governo de Evo Morales sabe que não pode elevar demais o preço. Há concorrentes no uso do gás. Elevar o preço demais pode provocar a substituição do insumo. No limite, a Bolívia tem mais a perder do que o Brasil."

A pesada presença da Bolívia no abastecimento do Brasil, apesar de fundamental, servirá apenas para reduzir os efeitos do déficit de oferta existente hoje. Considerando a expansão do Gasbol, o Brasil chegará a 2008 com um déficit diário de 17 milhões de m3. O déficit tende a ser reduzido a 1,9 milhão de m3 se o Brasil comprar mais gás de Evo. É um déficit contábil, provocado pela soma da demanda de gás para a produção de energia elétrica pelas térmicas. A demanda hoje para as usinas é de 31,9 milhões de m3 e subirá para 39,5 milhões de m3 a partir de 2008.

Não falta efetivamente gás no Brasil porque as térmicas estão desligadas. A demanda de energia elétrica é suprida com folga pelas hidrelétricas, que estão com os reservatórios cheios.