Título: 'O céu caiu sobre minha cabeça'
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Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2006, Economia & Negócios, p. B20

Roberto Rodrigues desabafa sobre a incapacidade dos agricultores de enfrentarem as crises

Durante o discurso na Feira de Negócios do Setor de Energia (Feicana/Feibio), em Araçatuba (SP), o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, desabafou sobre a incapacidade de o setor agrícola enfrentar as sucessivas crises durante o seu mandato. "O céu caiu sobre minha cabeça nesses três anos".

O ministro lembrou que, no período, o dólar esteve desvalorizado, os juros seguiram altos e surgiram casos de doenças como gripe aviária no mundo e aftosa no Brasil. "O bom é que pelo menos o próximo ministro vai pegar uma situação melhor do que eu peguei", observou. Ele lembrou que os três anos de crise fizeram parte dos períodos cíclicos naturais da agricultura, que a situação antes era melhor e que o setor deve se recuperar novamente em breve.

"Eu aprendi que agricultor nunca deve plantar quando os preços estão acima da média, porque eles só podem cair", disse Rodrigues. "Aprendi também que ninguém deve ser ministro quando os preços estão bons, porque a situação só deve piorar e, infelizmente, isso ocorreu comigo", completou. O ministro repetiu que a agricultura chegou ao fundo do poço.

No momento do discurso em que anunciava as medidas estudadas pelo governo para minimizar a crise, foi interrompido pelo vereador Edval Antonio dos Santos (PFL): "Nós não queremos saber das medidas para o futuro, porque os agricultores estão perdendo tudo agora; muitos estão tendo até propriedades penhoradas pelo Banco do Brasil", disse o vereador.

Rodrigues respondeu que também é agricultor, que está sentindo também os mesmos problemas e pediu um voto de confiança aos presentes. "Sei que não é um momento de festa, mas de desesperança; mas, se eu não conseguir avançar, eu não mereço esse voto de confiança", explicou o ministro.

Ele aproveitou ainda a cerimônia, realizada no evento sobre o setor sucroalcooleiro, para criticar o fato de os usineiros não cumprirem o acordo, feito em janeiro, que fixava em R$ 1,05 o teto para o álcool vendido nas usinas. "O setor produziu uma crise desnecessária por incapacidade de cumprir o acordo firmado com o governo."

Ao visitar a Feira de Negócios do Setor de Energia, Roberto Rodrigues afirmou que "não é vocação do governo federal fazer intervenção no setor sucroalcooleiro" para evitar novas crises de desabastecimento e explosões nos preços do álcool combustível.

De acordo com o ministro, a primeira medida a ser tomada para evitar novas distorções no mercado deve ser a criação, em conjunto com o setor privado, de uma política de estocagem do álcool, a ser anunciada, segundo ele, até o fim de maio.

Segundo Rodrigues, o volume de álcool a ser retirado do mercado para ser utilizado como estoque estratégico pode variar entre 1,5 bilhão e 2,5 bilhões de litros, de acordo com as diversas correntes que avaliam as medidas.

Rodrigues procurou evitar críticas aos usineiros como as feitas na edição de 2003 da mesma feira em Araçatuba. Na época, com uma situação semelhante, de desabastecimento e preços altos, Rodrigues chamou os usineiros de "malandros" e ameaçou enquadrá-los. Indagado se alguns usineiros continuavam malandros como em 2003, Rodrigues desconversou: "O repórter tem uma memória muito boa."