Título: Os preços da Petrobrás
Autor: Celso Ming
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/03/2006, Economia & Negócios, p. B2

O que é confuso não pode ficar esclarecido enquanto a confusão não acabar. Por mais que diga o contrário ou desconverse, a Petrobrás não esclarece como são definidos seus preços.

Quarta-feira, o presidente da empresa, José Sérgio Gabrielli, fez declarações que foram entendidas como adoção definitiva de critérios políticos para definição dos preços dos combustíveis. Ele disse em Brasília que, uma vez obtida a auto-suficiência, o País ficaria menos exposto às oscilações do mercado internacional. Como não há clareza nessa matéria, pareceu que os preços internos dos combustíveis ficariam definitivamente descolados dos vigentes no mercado internacional. Foi o que bastou para que as cotações das ações da empresa caíssem imediatamente 2% na Bolsa brasileira e, em seguida, em Nova York.

Diante disso, a Assessoria de Imprensa apressou-se em desmentir a interpretação e garantiu que nada mudaria. Mas persistiu a confusão porque ninguém, fora da Petrobrás, sabe como se formam os preços.

Em 2001, após o fim do monopólio, a Petrobrás definiu que seguiria as cotações internacionais convertidas em reais pelo câmbio interno. Mas a atual administração entendeu que os preços internos não poderiam estar sujeitos à volatilidade, que reage a cada mudança de temperatura no Hemisfério Norte ou a cada vazamento que ocorra num oleoduto.

Se não são convenientes revisões instantâneas, a Petrobrás ao menos poderia definir que a cada três ou quatro meses trataria de fazê-las, quando também seriam compensados eventuais ganhos ou perdas.

Para projetar a inflação interna e definir a política monetária (juros), o Banco Central trabalha com o pressuposto de que neste ano não haverá alteração dos preços da gasolina e do gás de cozinha, como repetem as atas do Copom. Mas a Petrobrás argumenta que os preços continuarão seguindo a trajetória internacional "porque o petróleo é uma commodity".

Não dá para dizer que os preços internos são sempre mais baixos para contentar o consumidor. Hoje, por exemplo, acontece o contrário. É o que diz a RC Consultores cujos cálculos apontam para uma diferença (a maior) dos preços internos sobre os externos de 6%, no caso da gasolina, e de 2%, no caso do óleo diesel.

Muitos argumentam que uma empresa estatal deve vender seus produtos a cotações sempre mais baixas, não só porque "o petróleo é dos brasileiros", mas também porque os custos de produção não passam de 25% dos preços internacionais. Ou, então, que não se justificam preços mais altos diante dos lucros monstruosos apontados nos últimos balanços.

Há pelo menos quatro razões pelas quais a Petrobrás teria de ser mais clara. A primeira é a de que nenhuma outra empresa terá interesse em investir no Brasil enquanto prevalecerem preços subjetivos. A permanente desatualização dos preços pode ser entendida como manobra para manter afastada a concorrência.

Em segundo lugar, o risco de quebra de faturamento (e de resultados) que se segue a uma política assim levanta dúvidas sobre a capacidade de investimento. A Petrobrás precisa avançar na prospecção e produção, na exploração do gás, na construção de oleodutos e gasodutos, na instalação de novas refinarias. Apenas neste ano, estão previstos investimentos de R$ 25,7 bilhões. Neste momento, procura parceiros para a refinaria do Nordeste. Qual a probabilidade de aparecerem interessados se os preços não acompanham o mercado?

Terceiro, a Petrobrás não é apenas uma estatal. É também uma empresa de capital aberto, com ações negociadas em Nova York e em Buenos Aires. Deve a todos os acionistas (e não apenas a seus controladores) plena satisfação sobre os critérios operacionais adotados.

Finalmente, se prevalecerem critérios subjetivos, cai por terra a racionalidade pela qual deve ser pautada a administração de uma empresa regida pelas leis de mercado, como defende a Petrobrás.