Título: Produtor de soja teme próximo passo de Evo
Autor: Agnaldo Brito
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/05/2006, Economia & Negócios, p. B5

A onda nacionalista criada pelo governo Evo Morales pôs em alerta uma legião de produtos brasileiros de soja do Departamento Santa Cruz, o maior da Bolívia. É nesta região que há 16 anos está uma atividade que hoje gera US$ 400 milhões em divisas com exportação, o segundo negócio internacional da Bolívia depois do gás natural.

No discurso que marcou a ocupação pelo Exército de refinarias e poços de petróleo e gás, Evo falou em nacionalizar não apenas os hidrocarbonetos. Incluiu no discurso recursos minerais e terras. O próprio ministro da Agricultura, Hugo Salvaterra, é um ativista do movimento sem-terra da Bolívia.

Zacarias Baldi, natural de Minas Gerais, há 12 anos está na Bolívia. Produz soja numa área de 4 mil hectares. Baldi, como outros produtores brasileiros, aguardam posição mais clara do novo governo em relação à política que adotará na gestão de terras. A lei 1715/96, chamada de Lei Inra (sigla para Instituto Nacional de Reforma Agrária), criou um sistema para averiguar a existência ou não de propriedades improdutivas. A idéia, explica Baldi, era a de fazer um novo censo agrário para revalidar títulos de propriedade e tirá-los quando configurado problemas como grilagem e latifúndios osciosos. Mas apenas 25% das áreas agrícolas da Bolívia foram recenseadas.

O temor é que esta seja uma oportunidade de mudança das regras de titularidade. Incluindo-se dispositivos que limitem tamanho de propriedade, o que na Lei Inra não existe.

"Acho que isso deverá ocorrer, mas espero que se alcance consenso na Bolívia para que isso não envolva terras produtivas, como a de muitos brasileiros", disse Nilson Medina, brasileiro e, hoje, um dos maiores plantadores de soja do país. Sozinho tem uma área de 7 mil hectares e acaba de investir US$ 1,5 milhão numa estrutura para preparação e estocagem de sementes de soja.

Medina, e outros brasileiros, já pediram - por intermédio da embaixada brasileira em La Paz - uma intervenção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Dada esta comoção nacional antiestrangeira, tememos por nossas terras e pelo futuro dos brasileiros que trouxeram para cá tecnologia e conhecimento na produção de soja. Isso deu ao país um negócio que ele não tinha", afirma Baldi.

Esta situação começa a influenciar decisões de investimento do setor. A área de 1 milhão de hectares (somados as áreas plantadas no verão e no inverno) está estagnada. A produção também não aumenta.

"Estamos com uma produção estabilizada, sem crescimento. Esta situação de incerteza interrompeu o avanço da cultura", diz o boliviano Carlos Rojas, presidente da Associação de Produtos de Oleaginosas e Trigo (Anapo). "A entidade quer uma posição de segurança jurídica no País. Pela lei atual há. Entretanto, é fundamental que esta seja garantida no futuro. Sem isso não há mais -investimentos", afirma.