Título: Situação de crianças em assentamentos é crítica
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/04/2006, Nacional, p. A11

Segundo pesquisa de faculdade de saúde, 14% apresentam sintoma grave de desnutrição

Um levantamento encomendado pelo governo e realizado pela Faculdade de Saúde Pública de São Paulo revela o quanto é precária a vida das crianças que moram em assentamentos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O trabalho, que analisou 1.428 menores de até 5 anos residentes em assentamentos do Semi-Árido, constatou que 14,8% apresentavam altura bem menor do que a esperada para a idade - um indicativo de desnutrição crônica. É um número bem alto, sobretudo quando se analisa o índice geral de déficit de crescimento de menores de 5 anos, residentes na mesma região - 6,6%, ou menos da metade do porcentual encontrado entre crianças de assentamentos.

Para o secretário de Avaliação e Gestão de Informação do Ministério do Desenvolvimento Social, Rômulo Paes de Sousa, os altos índices de desnutrição nos assentamentos não surpreendem. "Isso mostra a urgência de ampliarmos o investimento nutricional nesses locais", afirma. No grupo analisado, 663 crianças eram de famílias inscritas no programa Bolsa Família. Muitas eram beneficiadas também por outros programas assistenciais do governo. Mesmo assim, a qualidade de vida dessas famílias deixa muito a desejar. "Elas têm muito menos acesso a serviços de saúde e educação", afirma Sousa. E justamente por isso, diz, é preciso dirigir a esses grupos programas mais completos. Hoje, em assentamentos do Semi-Árido vivem aproximadamente 102 mil crianças.

O secretário afirma que ainda este ano deverá ser feita pesquisa para avaliar o estado nutricional de dois outros grupos vulneráveis: quilombolas e populações indígenas. "Para todos esses grupos é preciso intensificar políticas públicas nas áreas de saúde e educação e no Ministério de Desenvolvimento Social", diz Paes de Souza. Ele admite, no entanto, que o Bolsa Família não é indicado para todos. "Para determinados grupos indígenas, por exemplo, o Bolsa Família pode ser péssimo." É o caso, por exemplo, de populações indígenas que mantêm famílias estendidas (que compreendem mais do que apenas o núcleo tradicional). Ou grupos em que o dinheiro é menos importante do que a troca.

A análise do estado nutricional de crianças nos assentamentos é um braço do estudo cujos dados gerais foram apresentados segunda-feira, em São Paulo. A pesquisa analisou as condições de crianças com menos de 5 anos, residentes em Estados do Nordeste e norte de Minas.

O trabalho mostrou que 6,6% das crianças apresentavam retardo do crescimento - o que indica desnutrição por períodos prolongados. Embora tal porcentagem seja menor do que da década de 90 (17,9%), ainda é bem maior do que os índices considerados toleráveis pela Organização Mundial da Saúde (2,3%).

O trabalho mostrou que, no grupo inscrito no Bolsa Família, os índices de desnutrição eram menores. A redução variou de 25% (Alagoas e Bahia) a 30% (Paraíba). Em grupos assentados, a comparação não foi realizada.

A análise de crianças assentadas mostrou que, a exemplo de menores de 5 anos residentes em todo o Semi-Árido, alguns fatores aumentam o risco de desnutrição. Em crianças filhas de mães com baixa escolaridade e de famílias das classes D e C, por exemplo, o défict constatado foi maior.