Título: Lula diz que será julgado pelo povo e, em ato falho, admite candidatura
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/05/2006, Nacional, p. A4

Atendendo a pedido da cúpula petista, presidente faz agrado ao PMDB, afirmando que espera tê-lo em aliança

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, que não vai responder aos ataques das "pessoas nervosas", de quem não citou o nome, e que o povo é que vai julgar "quem é quem na política brasileira", referindo-se às próximas eleições.

Ele reafirmou que não é candidato e que tem prazo até 30 de junho para decidir, mas cometeu um ato falho quando falou sobre a busca de alianças. "O PT tem que ter maturidade para saber a importância da reeleição...", disse Lula, interrompendo em seguida a resposta aos jornalistas. Depois de gaguejar, prosseguiu: "...a importância da aliança política para o processo de reeleição", declarou.

Atendendo a pedido da cúpula do PT, Lula fez um aceno público ao PMDB. "Todo mundo sabe que temos interesse em fazer acordo com o PMDB. Há conversações, vamos aguardar o resultado. A gente não pode dar um passo adiante sem que a gente consulte cada um que está envolvido. Eu trabalho com a hipótese de uma aliança com o PMDB."

Cerca de 1.500 fiéis foram à missa do Dia do Trabalho e tomaram a Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem - Matriz de São Bernardo que nos anos 70 abrigou metalúrgicos em greve que fugiam da repressão. Desde 1976, Lula vai à matriz no 1.º de Maio. Só uma vez não foi, em 1980, por estar em uma cela do Departamento de Ordem Política e Social (Dops).

Do púlpito, que ontem lhe serviu de palanque, enalteceu seu próprio governo e fez política. Atribuiu a si o feito de 39 meses consecutivos com saldo positivo de geração de empregos e afirmou que nunca houve tantos recursos para o microcrédito. "Nunca o crédito consignado permitiu que tantos milhões de brasileiros pudessem ter acesso a um dinheirinho no final do ano para dar um presente ou para viajar", disse.

"Eu acho que as coisas estão andando", insistiu Lula, como se respondesse ao vigário-geral da diocese, Roberto Alves Marangon, que um pouco antes havia dado o tom do sermão ao clamar por "firmeza de ideais e correções corajosas".

O presidente chegou à matriz às 9h08, com a mulher, Marisa Letícia, que usava vestido vermelho. Acomodaram-se no primeiro banco, acompanhados do ministro Luiz Marinho (Trabalho). Logo atrás estavam os pré-candidatos do PT ao governo de São Paulo, Marta Suplicy e Aloizio Mercadante.

CRUZ

A missa, "Celebração da Resistência", durou duas horas e 20 minutos, com danças e cantos relativos às alternativas para o combate à exclusão e a abusos contra o trabalhador. Uma cruz de duas ripas de madeira, com a inscrição "desemprego", foi levada até o presidente por uma mulher negra vestida de branco. Depois de tomar a hóstia, Lula discursou. A cerimônia religiosa deu lugar a um ato político do presidente. Quatro vezes os aplausos o interromperam.

Lula contou o motivo que, segundo ele, o fariam ficar calado ante as críticas dos oponentes. "Quando cheguei à Presidência tomei a decisão de nunca ficar nervoso, de nunca perder a calma. O importante é ter a cabeça arejada. Porque o presidente é que nem um avô, não é nem pai, que tem direito de ficar nervoso com o filho, mas o avô", disse. "Não, o avô tem que estar sempre mais tranqüilo, dando conselho, e eu estou vendo algumas pessoas nervosas, irritadas, que xingam para cá e xingam para lá. Eu não respondo porque acho que o julgamento dessa gente, e o meu julgamento, não pode ser feito pelo baixo nível da disputa pela imprensa. Tem que ser feito pelo comportamento do povo, são vocês que vão julgar quem é quem na política brasileira.

" Após o culto, o presidente foi à praça, onde algumas centenas de pessoas o aguardavam com faixas e gritos de saudação. Onde ia Lula, lá estava o senador Mercadante. Marta já havia se retirado. Lula falou da reeleição. "O PT sabe que não estou pressionando, que tenho até 30 de junho para decidir sim ou não. Nessas alturas do campeonato quem tem pressa são os outros.

" O presidente aproveitou para complementar o que dissera e, assim, evitar ferir suscetibilidades: "Jamais farei qualquer gesto para que o PMDB não tenha candidato próprio. Pode ter, não tem nenhum problema."