Título: Será uma boa opção apostar no fracasso?
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Fonte: O Estado de São Paulo, 25/05/2006, Internacional, p. A15

Será preciso mergulhar os palestinos na miséria? Esta é a pergunta que se faz o Quarteto (Estados Unidos, Rússia, União Européia e ONU) que articula a ajuda do Ocidente.

Os palestinos votaram, democraticamente, em 25 de janeiro, mas em vez de renovarem a confiança na Fatah (que hoje preconiza a via política), deram vitória ao Hamas (Movimento da Resistência Islâmica), partido "terrorista". O resultado é a Autoridade Palestina (AP) dividida entre seu presidente e chefe da Fatah, Mahmud Abbas, que quer negociar com Israel, e o Executivo, emanação do Hamas terrorista.

O novo primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert, não negocia com o Hamas nem com o presidente da AP, o moderado Abbas, visto como "incapaz de impor a vontade ao Hamas". A questão é saber como o Quarteto poderia obrigar o Hamas a abandonar o terrorismo. A resposta é financeira: a AP está em ruínas. Subsiste graças à ajuda das potências. Portanto, basta estancá-la para levar os palestinos à fome e forçar o Hamas a renunciar ao "terrorismo". Essa estratégia será razoável? Ela é compreensível. Como sustentar um poder que se recusa a denunciar os atentados que matam civis em Israel? Cuja carta fundadora faz de toda a região terra islâmica e de Israel um intruso a ser eliminado? A via do Ocidente é a do "estrangulamento". O Congresso dos EUA votou terça-feira um projeto de lei que proíbe toda ajuda, exceto a humanitária, a uma AP dirigida pelo Hamas.

Entretanto, algumas vozes discordam no Ocidente. Elas gostariam de acreditar na diplomacia, com dois argumentos: 1) O Hamas é menos monolítico do que pretende e abriga duas tendências, uma que preconiza a jihad (guerra santa); outra, pragmática, se alinharia à doutrina de "dois Estados", tendo como primeira etapa a normalização das relações com Israel em troca da criação de um Estado palestino nas fronteiras de 1967. Ora, castigar a AP cortando-lhe a ajuda financeira favoreceria os extremistas terroristas e enfraquecer os moderados.

2) A tomada da AP pelo Hamas decorre da eleição de janeiro. Ora, esse recurso à democracia era um desejo do Ocidente. Será o caso de aceitar que o triunfo da "democracia" num país islâmico teria agravado o conflito? Seria aceitar o fracasso da democracia que o Ocidente tenta impor no Oriente Médio.

É este o dilema ocidental: suspender o dinheiro, com o risco de favorecer a escolha desumana do terror? Ou uma última tentativa, salvar as chances da democracia em um país muçulmano?

*Gilles Lapouge é correspondente do 'Estado' em Paris