Título: Em meio ano, um festival de 'bondades'
Autor: Sônia Filgueiras
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/06/2006, Economia & Negócios, p. B4

Correção da tabela do IR, elevação do mínimo e recursos para habitação são apenas algumas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é competitivo no palanque porque a economia, por enquanto, vai bem. Mas não é só por isso. Há meses o governo vem soltando sucessivos pacotes recheados de bondades dirigidas aos mais diversos públicos com o objetivo de aditivar a economia e fidelizar eleitores.

O ano começou com a decisão de corrigir a tabela do Imposto de Renda em 8%, trazendo alívio à classe média assalariada. O Tesouro Nacional, por sua vez, perdeu R$ 2,750 bilhões por ano em arrecadação.

Ainda em fevereiro, Lula anunciou a elevação do salário mínimo, de R$ 300,00 para R$ 350,00, acompanhada da antecipação de sua vigência, de maio para abril. De acordo com levantamentos do Departamento Intersindical de Pesquisas Socio-Econômicas (Dieese), o aumento do mínimo eleva de imediato o rendimento de 40 milhões de brasileiros pobres. .

Pouco depois, em fevereiro, o governo anunciou um grande pacote destinado a estimular a compra da casa própria e o setor da construção civil. O pacote incluiu redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para produtos usados na construção de habitações, como caixas d'água, portas e janelas de madeira, e R$ 18,7 bilhões em crédito para a compra da casa própria.

Como freqüentemente ocorre em anúncios pré-eleitorais, um dos números do pacote estava anabolizado: dos recursos destinados ao financiamento de novas moradias, só R$ 550 milhões são novos. O restante já estava previsto nos orçamentos da União e do FGTS.

No início de abril, o governo inaugurou outra seqüência de boas notícias: aumento de 20% nos benefícios do Bolsa-Família, principal programa social de Lula. Em maio, cedeu à pressão dos agricultores e soltou um pacote de apoio para o setor e ainda reservou R$ 2 bilhões para pequenas prefeituras - elevando repasses para a merenda escolar e abrindo uma linha de crédito do BNDES para renovação da frota municipal.

Fechou maio com um anúncio dedicado aos aposentados e pensionistas clientes do crédito consignado: os juros foram fixados em 2,9% ao mês.Junho será marcado por uma variada rodada de aumentos para diversas categorias do funcionalismo público. "O que estamos assistindo neste ano é irrepetível', insiste Fábio Giambiagi, do Ipea, apontando que o gasto público tem crescido entre 8% e 10% acima da inflação de 2003 para cá.

As medidas dirigidas aos pobres têm inegável efeito eleitoral, mas sua eficiência como política pública é discutível. O economista Marcelo Neri, que coordena estudos na área de combate à pobreza na Fundação Getúlio Vargas (FGV), elogia o Bolsa-Família, mas critica a opção federal por aumentos reais do salário mínimo. Segundo ele, o Bolsa-Família tem grande capacidade de atingir as camadas miseráveis, nas quais quase metade são crianças.

No caso do mínimo, que beneficia principalmente aposentados e pensionistas, o efeito é diluído, o que reduz a eficiência. "O Brasil tem de optar por alternativas mais modernas", diz.