Título: PCC impõe lei do silêncio em enterro
Autor: Marcelo Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/06/2006, Metrópole, p. C1

Não faltaram ameaças, medo, tensão. Sob uma evidente lei do silêncio, centenas de pessoas acompanharam, ontem à tarde, os enterros de 5 dos 13 supostos integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) no Cemitério Jardim da Colina, um dos mais caros de São Bernardo do Campo, no ABC.

Era uma pequena multidão formada por parentes, amigos e conhecidos, que foram se despedir de Mário Tavares, Wellington de Araújo Carvalho, Evilson Rodrigues de Oliveira, Marcelo dos Santos e Adriano Wilson da Silva, o Boy, apontado pela polícia como um líder regional da facção criminosa em São Bernardo.

Com o passar das horas, parecia que o PCC ou seus simpatizantes haviam tomado conta do cemitério e de quarteirões vizinhos. Homens andando em grupos, vários deles armados, eram vistos por toda a parte. Entre funcionários, coveiros e vigias, insegurança e desconforto eram visíveis. Para jornalistas, sobraram agressões.

Dois repórteres-fotográficos do Estado que tentaram registrar os velórios foram cercados, ameaçados - um deles com uma arma - e expulsos do cemitério. Apenas três pessoas aproveitaram a chance de falar sobre a morte dos acusados. Um rapaz e duas moças, que, sem se identificar, contaram que os suspeitos não reagiram aos tiros disparados pela polícia e teriam sido executados.

ROMARIA

Nas salas de velório decoradas com grandes coroas de flores, parentes próximos alternavam lágrimas e orações. A que chamava mais atenção era a sala em que estava Boy, por onde passaram mais de 300 pessoas. Era quase como o enterro de uma celebridade, uma pessoa querida na comunidade.

Foi preciso até organizar fila de entrada na porta para que a família não fosse sufocada dentro da sala. Um homem de meia-idade, bastante emocionado, pedia aos gritos: "Entrem só cinco de cada vez."

As pessoas, de todas as idades, obedeciam. Em romaria, esperavam a chance de tocar no caixão e fazer uma reverência a Boy, cujo corpo estava coberto por uma camisa 10 do Corinthians. Dentro da sala, onde a mãe chorava descontrolada, era possível ouvir a Ave Maria sendo repetida em coro, como na reza do terço católico. A reportagem foi impedida de acompanhar o enterro de Boy, que começou com atraso, às 17h30.

Um pouco antes, aconteceu o enterro de Mário Tavares que tinha apenas 25 anos e três filhas, com idades entre 8 e 11 anos. Mário estava envolvido com o PCC havia anos e não conseguia sair da organização. Era apaixonado pelas filhas e considerado um pai dedicado. Na hora em que seu caixão descia a sepultura, a filha mais velha entrou em choque. O caixão foi aberto para que a menina se despedisse mais uma vez. "Me enterra com ele", gritava a garota.

Mesmo sendo de origem humilde, a maioria dos mortos teve enterros caros. No Jardim da Colina o jazigo mais simples custa R$ 6.630,00. O mais caro, R$ 18.610,00.