Título: 'Estamos a caminho da normalidade'
Autor: Lu Aiko Otta, Fabio Graner
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/10/2006, Economia, p. B4

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, olhou satisfeito para o terminal instalado em seu gabinete, permanentemente transmitindo notícias da Broadcast, sistema de informações em tempo real da Agência Estado. Acabava de pipocar a notícia de que o Banco do Brasil havia cortado as taxas de juros do cheque especial, do cartão de crédito e do crédito direto ao consumidor, em coerência com o corte de 0,5 ponto da Selic. 'Viram só?'

Apesar da queda da taxa de juros, que está hoje no menor nível nominal em 12 anos, Mantega acha que ela ainda está elevada. É, para ele, o elemento destoante no conjunto de bons resultados que o Brasil tem a apresentar. Num eventual segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, disse, a política monetária continuará a mesma, mas as taxas poderão cair mais rapidamente porque não há mais a missão de derrubar a inflação. Seguem os principais trechos da entrevista concedida ao Estado.

Foi feito mais um corte de 0,5 ponto nos juros. Na sua avaliação a taxa ainda está alta?

O Copom está prosseguindo na trajetória de redução da taxa de juros, numa posição coerente com o regime de meta de inflação. Como a inflação tem comportamento benigno, caindo, se mantendo nos patamares esperados, então o Copom reagiu à altura e reagiu a taxa. Estamos com a menor taxa nominal dos últimos 12 anos.

Mas ela ainda está alta?

Ainda está. Mas vem caindo desde setembro do ano passado, portanto caminha para um patamar adequado. É uma questão de tempo.

Em quanto tempo chegaremos a um patamar adequado e qual é ele?

O ministro da Fazenda não pode dizer em quanto tempo ela vai chegar (ao nível adequado), ou estaria predeterminado as taxas do Copom. Como elas dependem da conjuntura, do quadro econômico e do quadro monetário, devem continuar caindo ano que vem. Temos o preço do petróleo caindo, preços dos combustíveis em baixa, preços administrados e preços livres com comportamento benigno, a própria taxa cambial ajuda a ter inflação mais baixa. Os determinantes da inflação indicam para uma taxa baixa. Então, continuará havendo redução.

E num eventual segundo governo Lula, como seria a política monetária?

Continua a mesma filosofia. Estamos no período da colheita. Uma das diferenças do primeiro mandato para o segundo é que no primeiro tínhamos de baixar a inflação para patamares razoáveis. Havia o risco de acelerar o crescimento e ter alta da inflação. Feito esse ajustamento, passamos para uma fase onde a política monetária é mais flexível. Daqui para frente, é caminhar em direção a uma taxa de juros compatível com outros países emergentes. Eu diria que a taxa de juros hoje é uma das variáveis que destoam do restante da economia brasileira. A taxa de juros alta é uma espécie de herança dos desequilíbrios do passado. Mas caminha rapidamente para essa normalidade.

Caminhará mais rapidamente?

Como estamos com a inflação sob controle e ela está dentro das metas, então deve caminhar para um nível adequado.

Mais rapidamente?

É. Não vejo a necessidade de elevá-la. No passado, tivemos de fazer por causa da inflação.

Mas a trajetória de queda será nesse ritmo de meio ponto ou será algo mais forte?

Você está fazendo uma pergunta que não posso responder, porque estaria dizendo: 'O Copom vai reduzir x% ou y%.' Não posso predeterminar a decisão do Copom. A taxa de juros está propiciando um cenário favorável para o crescimento maior da economia. Há uma correlação estreita entre juros e crescimento da economia.

Com os cortes, o Banco Central estaria corrigindo um exagero na dose cometido no passado?

Pode ter cometido erros, acertos. O que importa é que hoje se criaram as condições para um crescimento equilibrado sem inflação.