Título: ONU quer fim da violência invisível
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2006, Metrópole, p. C12

Grande parte da violência contra as crianças no mundo continua invisível para a Justiça, já que ocorre em casa, nas escolas e na comunidade onde elas vivem. Para complicar, em várias sociedades, certo grau de violência é tolerada como medida disciplinar. Essas são algumas das principais conclusões do estudo mais completo feito pela ONU sobre a violência contra crianças. O responsável foi o brasileiro Paulo Sergio Pinheiro, ex-ministro de Direitos Humanos no governo de Fernando Henrique Cardoso, que levou três anos para preparar o estudo encomendado pelo secretário-geral da ONU, Kofi Annan.

O estudo será lançado hoje em Genebra e apresentado ainda neste mês à Assembléia Geral da ONU, em Nova Iorque. ¿A mensagem desse estudo é que nenhuma violência contra a criança é justificável e que toda essa violência pode ser prevenida. Não deve haver mais espaço para desculpas¿, afirmou Pinheiro. O estudo foi feito com base em entrevistas com crianças em todos os continentes, além de consultas à organismos internacionais e governos.

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam para uma taxa de 53 mil crianças mortas todos os anos por homicídio no mundo. Por ano, 150 milhões de meninas e 73 milhões de meninos são forçados a ter relação sexual e entre 100 milhões e 140 milhões de meninas sofrem mutilação genital.

Para Pinheiro, está claro que a violência ocorre em todas as classes sociais, em todas as religiões e em todo o mundo. O que mais preocupa o autor é que, na maioria dos casos, os autores de atos violentos são pessoas que vivem próximas às crianças, como pais, professores, colegas de escola e empregados.

Segundo dados da Unicef, entre 133 milhões e 275 milhões de crianças são vítimas ou testemunhas de violência em casa. Em muitas sociedades, a violência contra a criança é tolerada, já que ganha uma conotação de ¿medida de disciplina¿.

O medo de denunciar os autores da violência é o que faz a violência contra crianças continuar escondida. Nas escolas, orfanatos e, principalmente, centros detenção juvenil a situação é ainda pior. Segundo o relatório, 1 milhão de crianças estão presas no mundo.

O número de crianças trabalhando também preocupa. O relatório estima que 218 milhões de menores estejam trabalhando. Pinheiro fez uma lista de recomendações à ONU. A primeira é que os governos devem ter a consciência de que são responsáveis por garantir segurança às crianças e devem investir em programas para lidar com razões da violência.