Título: Perdendo espaço
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Fonte: O Estado de São Paulo, 07/10/2006, Notas e Informações, p. A3

Nossas exportações continuam a crescer num ritmo forte, mas o exame do destino dos produtos brasileiros mostra que, em importantes mercados, a participação do País diminuiu nos últimos meses. Por razões diversas, o Brasil não conseguiu manter a fatia que conquistou em quatro mercados decisivos - EUA, México, Rússia e África do Sul -, não apenas pelo volume de produtos brasileiros que absorvem, mas sobretudo pelo fato de que têm potencial para absorver muito mais.

A perda de espaço nesses mercados foi compensada pelo bom desempenho dos produtos brasileiros em outros que absorvem parcela expressiva das exportações do País, como a União Européia, o Japão e a China, como constatou um estudo da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex).

Melhor seria se o crescimento da fatia dos produtos brasileiros fosse mais homogêneo nos principais mercados, o que garantiria maior estabilidade às exportações. Mas, além de fatores conjunturais que levaram à perda de espaço nos mercados citados, há outro que se torna uma ameaça cada vez mais séria ao crescimento das nossas exportações: a concorrência agressiva que o produto brasileiro vem enfrentando, aqui e no exterior, dos artigos chineses.

Os dados da Funcex mostram como é difícil a conquista de fatias nos mercados onde a concorrência é mais acirrada. Os produtos brasileiros respondiam por 1,29% das importações feitas pelos EUA no período de 12 meses encerrado em junho de 2002. Três anos depois (junho de 2005), a fatia dos produtos brasileiros tinha aumentado para 1,43% das importações totais dos EUA. A perda do espaço no mercado americano, ao contrário da conquista, pode ser rápida. Nos 12 meses encerrados em junho de 2006, a fatia tinha diminuído para 1,30%, praticamente a mesma de quatro anos atrás.

Com pequenas variações, a mesma tendência (aumento em 2005, na comparação com 2002, e queda neste ano) foi observada na participação do Brasil nas importações do México (de 1,22% das importações totais do país em 2002, 2,04% em 2005 e 1,77% em 2006), África do Sul (1,53%, 2,22% e 2,09%) e Rússia (2,09%, 2,18% e novamente 2,09%).

Nas exportações para os EUA, a valorização do real em relação ao dólar é apontada como principal responsável pela redução observada nos casos de calçados, compressores, móveis, automóveis e tratores. A falta de encomendas ou a falta de capacidade de produção explicam a queda nas exportações de outros bens, como aviões e aço. Nas trocas do Brasil com o México, também o câmbio é a explicação para a queda de nossas exportações, em particular de automóveis. Quanto à Rússia, a explicação para a redução da fatia dos produtos brasileiros nas importações desse país é o embargo imposto por Moscou às carnes suína e bovina originárias do Brasil.

Esses são fatores conjunturais (câmbio) ou decorrentes de políticas comerciais pouco claras (caso do embargo russo), cujos efeitos podem desaparecer ou se reduzir em prazo relativamente curto. De outra natureza é a concorrência que os produtos chineses fazem ao similar brasileiro e que tende a se tornar mais intensa.

Como mostrou o Estado na semana passada, produtos chineses já afastam os brasileiros em importantes mercados, entre eles o americano. Levantamento feito pela Fundação Getúlio Vargas estimou em US$ 1,5 bilhão as perdas das exportações brasileiras entre 2002 e 2004 em conseqüência do crescimento das exportações chinesas. Nossos produtos de exportação mais afetados pelo crescimento da presença de similares chineses no mercado externo são calçados, rodas, aparelhos de telefonia e componentes de computador.

O volume talvez não assuste, mas se se levar em conta que essa concorrência deve chegar rapidamente aos mercados de automóveis e aço, itens dos quais o Brasil é grande exportador, pode-se ter uma idéia mais exata de quanto a China, que o governo Lula escolheu como parceiro estratégico do Brasil, pode afetar nossas exportações e, conseqüentemente, o desempenho de nossa economia.