Título: Padre é processado no Rio por realizar falso casamento
Autor: Clarissa Thomé
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/11/2006, Vida&, p. A29

A funcionária pública Roberta Ferreira di Fazio, de 30 anos, decidiu processar o padre que realizou seu casamento em maio deste anos ao descobrir que a cerimônia não tinha validade para a Igreja Católica. O evento foi considerado duplamente irregular, primeiro porque foi realizado em uma casa de festas, o que não é autorizado pela Igreja em algumas cidades, como Rio, Niterói e Nova Friburgo. Segundo porque o padre Alberto Ribeiro Morgado não tinha autorização para atuar fora de sua paróquia.

Ele já havia sido punido em 2002 e ficou impedido de rezar missas, batizados e casamentos. Em 2005 recebeu uma autorização especial, mas vem desobedecendo seus superiores. Há um inquérito aberto na 6ª Delegacia de Polícia para apurar as denúncias.

'Meu casamento virou um pesadelo. O padre atrasou uma hora e meia, período em que passei chorando, com 150 convidados esperando. E depois descobri que a cerimônia não tem valor', desabafou Roberta. Ela e o técnico em telecomunicações Luís Gustavo Lobato Gageiro, de 34 anos, haviam sido informados de que o padre era o único que tinha autorização do Vaticano para fazer as cerimônias em salões porque é tetraplégico. 'Esse dinheiro o ajudaria no tratamento. Quando descobri que isso era mentira, me senti ainda mais lesada', disse a noiva.

A verdade só veio à tona porque uma amiga de Roberta comentou com outro padre o inusitado atraso de Morgado. 'Ele, então, disse que o casamento realizado por padre Alberto não tem registro na Cúria, e que vinha sendo procurado por vários casais que tinham de convalidar o casamento', contou ela, que terá de casar novamente, dessa vez na igreja.

Roberta começou a procurar pessoas em situação semelhante. Chegou a José Antônio Amador Júnior, de 30 anos, e Clarisse Pacheco Amador, de 29. 'Minha mulher queria casar na igreja em que os pais se casaram. Fomos recebidos por padre Alberto, e ao contratar o músico, ele nos avisou que o padre estava suspenso', contou Amador Júnior, que é advogado.

'Processamos a Capela da Pequena Cruzada e ganhamos em segunda instância.' O local esteve fechado por 18 anos e reabriu, com Morgado à frente, como 'capela ecumênica', sem ligação com a Igreja Católica. 'Ninguém nos avisou que a capela não era reconhecida pela Igreja', disse Amador Júnior. 'Tem uma fila de casais nessa situação', disse. A Polícia Civil confirmou a existência do inquérito, mas a delegada responsável não atendeu a reportagem.

'É difícil acreditar que casos como esses ainda ocorram', disse o chanceler da Cúria do Rio, padre André Feitosa. 'Divulgamos um alerta sobre padre Alberto e em todos os cursos de noiva do Rio avisamos que ele está suspenso'.

No mês passado, padre Alberto abençoou a união da atriz Flavia Alessandra com o apresentador Otaviano Costa. Não era uma cerimônia de casamento, pois ela já havia se casado no religioso com o ator e diretor Marcos Paulo.

O bispo de Nova Friburgo, d. Rafael Llano Cifuentes, contou que Morgado foi 'suspenso de ordem' em 2002 por fazer cerimônias em clubes, fazendas e salões. 'Algumas dioceses não admitem casamentos fora da igreja para evitar a banalização do sacramento', explicou o bispo.

Levando em conta o 'a boa disposição e o arrependimento' do padre, d. Rafael autorizou que ele voltasse a atuar 'unicamente dentro do território da paróquia de Nossa Senhora da Conceição do Engenho Novo', na zona norte do Rio. 'O problema é que ele já não está trabalhando ali. Não se deu bem com o pároco', contou. 'Se essa situação se verificar, ele será suspenso de ordens novamente'. O caso será examinado pelo Tribunal Eclesiástico de Niterói.