Título: São Paulo perde mais da metade da produção de veículos do País
Autor: Tereza, Irany.
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/11/2006, Economia, p. B12

O setor automobilístico, que foi um dos pilares da industrialização em São Paulo - o maior parque fabril do País -, consolida o movimento de desconcentração e já passa a puxar a produção em Estados sem tradição industrial. Em 2005, segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), menos da metade (45,8%) dos veículos produzidos no País saiu das linha de montagem de São Paulo, Estado que concentrava 74,8% da produção 15 anos antes.

A perda de 29 pontos porcentuais na participação paulista ocorreu a despeito de o Estado ter praticamente dobrado o volume de carros produzidos no período, de 684 mil para 1,158 milhão. Ou seja, não foi bem São Paulo que perdeu, mas outros Estados é que passaram a ter fatias maiores do bolo. A indústria automobilística foi uma das que ocuparam os primeiros lugares na fila em busca dos benefícios oferecidos durante a guerra fiscal.

Em 1990, Minas Gerais (que abriga fábricas da Fiat, Mercedes-Benz e Iveco) tinha a segunda maior produção de veículos do País, com 24,5% do mercado. Uma participação residual de 0,7% era dividida pelo Paraná (Volkswagen) e Rio Grande do Sul (GM). No ano passado, Minas também perdeu participação relativa, enquanto Paraná e Bahia se destacaram com 12,6% e 9,8%, respectivamente. Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro vêm a seguir, com 5,6% e 5,2%, enquanto Goiás tem produção marginal de 0,8%, com uma unidade da Mitsubishi.

A experiência da Ford na Bahia é a primeira incursão das montadoras pelo Nordeste e a mais recente etapa do 'êxodo automotivo'. Inaugurada em outubro de 2001 no pólo de Camaçari, a fábrica já produz 250 mil veículos por ano, 'um a cada 80 segundo', diz a campanha promocional da empresa. Uma prova de que o negócio deu certo é que a Bahia deve ultrapassar o Paraná este ano em participação relativa.

Desempenho surpreendente para uma iniciativa que foi alvo de piadas na época do anúncio, do tipo que apresentava os modelos de carro com 'coqueiro solar' e dez marchas, oito delas lenta. Esta semana, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou pesquisa mostrando que o Nordeste ganhou participação no Produto Interno Bruto (PIB) de 2003 para 2004, 'influenciado principalmente pela Bahia'.

'O processo de desconcentração industrial vem ocorrendo desde os anos 80 e com a indústria automobilística a partir dos 90. É mais caro montar uma fábrica no ABC do que na Bahia', comenta Isabela Nunes, do Departamento de Indústria do IBGE.

LIDERANÇA

Isabela comenta que os automóveis estão liderando o desempenho dos bens duráveis no País, o que está apresentando impacto direto na produção total. Tanto que em setembro, quando a greve nas montadoras derrubou a produção de automóveis, puxou para baixo todo o desempenho da indústria, que teve recuo de 1,4%, anulando os ganhos dos dois meses anteriores.

'O setor automotivo está em grande evolução, principalmente no mercado interno, empurrado pelo crédito e pelas taxas de juros mais favoráveis. Esse dinamismo já se reflete até nos índices de emprego no setor. Embora não seja intensivo em mão-de-obra, já é o terceiro que mais emprega', diz Isabela.

Edgard Pereira, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi)comenta que o setor teve expansão mais mais forte em 2004, de 25%. 'Ali foi o pico. No começo de 2005, começou a apresentar um ritmo mais lento de crescimento e em setembro de 2006, a taxa acumulada no ano foi de 1,6%. O comportamento de 2004, realmente, alavancou os Estados onde a indústria automotiva se instalou, mas agora vem perdendo o ritmo.'

Segundo ele, o comportamento este ano ainda está muito irregular e é arriscada qualquer projeção para a tendência dos próximos anos, mas frisa que a redução no ritmo 'não contradiz o fato de que a descentralização foi positiva e serviu como alavanca para outros Estados'.

Diretor-corporativo da PSA Peugeot Citrõen, Rodrigo Junqueira, acompanhou o processo de instalação da fábrica no município fluminense de Porto Real, então recém-emancipado de Resende (onde está localizada a fábrica de caminhões da Volkswagen), na região do Médio Paraíba. Em torno da área que ocupou instalaram-se, na mesma época, cinco empresas fornecedoras de peças e montaram o 'tecnopolo'.

O complexo estava previsto no planejamento da empresa para tornar viável a montagem de veículos numa área onde não havia indústria alguma. 'Na onda dos novos investimentos do setor, fomos o último construtor a chegar ao País e a escolha de Porto Real seguiu aspectos de ordem técnica e econômica', diz ele, lembrando que, na época o governo do Estado chegou a ser sócio do investimento, com 32% de participação no capital. Três anos depois, vendeu a participação.

Desde o anúncio da instalação da fábrica em Porto Real, em 1998, até hoje, a PSA Peugeot Citroen investiu US$ 750 milhões na unidade industrial e hoje emprega 2.350 funcionários diretos e outros 550 terceirizados. Para formar mão-de-obra, o acordo com o governo previu a criação de um curso de especialização no Senai na região.

'Nossa chegada trouxe outras empresas e não seria pretensioso dizer que estamos contribuindo para uma migração positiva no Estado do Rio', diz Junqueira, lembrando que a montadora mantém um ritmo de crescimento que corresponde ao dobro do mercado e espera avançar 10% no próximo ano. O executivo ressalta que a participação no mercado, de 5,3%, está maior que o previsto inicialmente. 'A questão é que o mercado está crescendo de maneira mais lenta que o esperado.'