Título: D. Cláudio Hummes, arcebispo de SP, assume alto posto no Vaticano
Autor: Mayrink, José Maria
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/11/2006, Vida&, p. A22

O cardeal d. Cláudio Hummes, até agora arcebispo de São Paulo, é o novo prefeito da Congregação para o Clero, um dos mais importantes discatérios, uma espécie de ministério, do Vaticano. Sua nomeação foi anunciada ontem em Roma, onde substituirá o colombiano Darío Castrillón Hoyos, de 77 anos, que renunciou por idade.

¿Eu soube da notícia há um mês, quando o cardeal Tarcisio Bertone, secretário de Estado, me telefonou para informar que o papa Bento XVI me havia escolhido para esse cargo, mas era um segredo que eu não podia divulgar antes da confirmação oficial¿, disse d. Cláudio, ontem à tarde, em sua residência. Nem seus sete bispos auxiliares, com os quais teve uma reunião na segunda-feira, haviam sido comunicados.

A transferência foi uma surpresa para d. Cláudio. ¿Tenho 72 anos e esperava continuar em São Paulo por mais três anos, até completar a idade em que os bispos devem renunciar às suas funções.¿ Três anos, observou o cardeal, seria pouco tempo para ele concluir o trabalho iniciado em 1998, quando substituiu o cardeal d. Paulo Evaristo Arns.

¿Eu teria ainda muita coisa a fazer aqui¿, disse d. Cláudio, enumerando, nessa ordem, a construção de um seminário propedêutico (curso médio), a recuperação da Capela de Nossa Senhora da Boa Morte, na Rua do Carmo, e a ampliação do Centro de Atendimento ao Trabalhador (Ceat). O desemprego em São Paulo é uma de suas preocupações.

Quanto à crise da PUC-SP, que demitiu 472 professores e 374 funcionários administrativos (30% da folha de pagamento) para enfrentar uma dívida de R$ 107 milhões, o cardeal observou que deixa o problema bem encaminhado, pois os compromissos estão sendo pagos. ¿Vivi os dias mais difíceis de minha existência, quando tive de aprovar essas demissões¿, revela d. Cláudio.

Embora lamente ter de interromper seu trabalho em São Paulo, uma das dioceses mais importantes do mundo, o cardeal não disfarça a satisfação por atender a um apelo do papa. ¿Vou prestar um serviço à Igreja universal, ao assumir um cargo de responsabilidade tão grande¿, observou. A Congregação para o Clero, criada em 1967 por Paulo VI, tem sob sua responsabilidade cerca de 440 mil padres, entre diocesanos e religiosos.

Como prefeito da Congregação para o Clero, d. Cláudio vai cuidar principalmente dos diocesanos - padres e diáconos - mas de certa forma também dos religiosos (pertencentes a ordens e congregações religiosas), que como sacerdotes se submetem às mesmas normas, quando exercem funções pastorais.

¿Minhas atribuições vão mudar um pouco, porque a Congregação para o Clero vai assumir a formação dos seminaristas, hoje por conta da Congregação para a Educação Católica, que em contrapartida ficará com o Departamento Catequético¿, anuncia d. Cláudio.

Um dos problemas que o cardeal brasileiro enfrentará em seu novo posto são as denúncias de prática de pedofilia por padres católicos. ¿Esses escândalos são um doloroso desafio que a Igreja vem combatendo com a adoção de critérios e métodos mais rigorosos na seleção e formação dos seminaristas¿, disse d. Cláudio. ¿Não levo projetos prontos para Roma, pois o que tenho de fazer é seguir a orientação do papa.¿

Com a confirmação de sua transferência para o Vaticano, d. Cláudio já deixou de ser arcebispo de São Paulo. ¿A partir de agora, sou o administrador apostólico da arquidiocese, função que cumprirei até a designação de meu sucessor¿, informou o cardeal a dois de seus bispos auxiliares, d. Pedro Luiz Stringhini e d. Odilo Pedro Scherer, que foram cumprimentá-lo ontem à tarde.

A promoção do cardeal era esperada, mesmo que ele diga ter ficado surpreso. Citado com insistência entre os papáveis, ou candidatos à sucessão de João Paulo II no ano passado, seu nome apareceu entre os prováveis novos ocupantes da Cúria Romana, quando Joseph Ratzinger foi eleito. Especulava-se que ocuparia a Congregação para a Doutrina da Fé.

D. Cláudio espera seguir para Roma nos próximos 30 dias. Até lá, vai encaminhar a solução de problemas pendentes, entre os quais a preparação da visita de Bento XVI a São Paulo, em maio. ¿Não estarei mais aqui, mas certamente acompanharei o papa em sua viagem ao Brasil.¿ Segunda-feira ele se reunirá com d. Odilo, que é o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), para tratar da 5ª Conferência do Episcopado da América Latina e do Caribe, que se realizará em Aparecida, em maio.

Sem revelar em quem votou na eleição de domingo, d. Cláudio afirmou acreditar que o presidente Luis Inácio Lula da Silva, seu amigo desde a década de 70, fará um bom governo. ¿Lula foi eleito pelos pobres e tem inspiração¿, observou o cardeal.