Título: 2010, sem Lula, começa amanhã
Autor: Marchi, Carlos
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/12/2006, Nacional, p. A10

Acabada a festa da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu segundo mandato, estará imediatamente instalada a temporada da sua sucessão, como prescreve uma das mais inevitáveis regras da política brasileira. A partir de amanhã, todos os movimentos dos partidos e potenciais candidatos serão prescritos por um primeiro olhar no aperitivo - as eleições municipais de 2008 - e o foco no prato principal, as eleições de 2010, nas quais Lula não poderá mais se candidatar, depois de ter concorrido nas cinco últimas eleições presidenciais.

Entre os potenciais candidatos à Presidência em 2010, os dois mais notórios são os tucanos José Serra (SP) e Aécio Neves (MG), que tomarão posse amanhã como governadores de seus Estados com os olhos fixos naquela eleição. Para o PT, começa uma convivência antecipada de quatro anos com o grande dilema - uma eleição presidencial na qual o partido não poderá contar com Lula como candidato, uma situação inédita em seus 26 anos de existência.

No máximo, o presidente Lula será - se quiser - o cabo eleitoral de um candidato que, segundo os petistas, poderá ser o novo governador da Bahia, Jaques Wagner, que teve surpreendente desempenho nas eleições de 2006, a ministra Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil de Lula, ou a ex-prefeita Marta Suplicy. O PSB sonha com a candidatura de Ciro Gomes (CE). O PFL e o PMDB não têm candidatos visíveis.

Se o impasse do PT é não ter um forte candidato, o do PSDB é ter dois. Até aqui eles têm exibido um civilizado e cuidadoso entendimento. Acabam de patrocinar um acordo em que São Paulo e Minas Gerais repartem os dois principais cargos que cabem à bancada federal do partido: o paulista Antônio Carlos Pannunzio, apadrinhado de Serra, será o líder do PSDB na Câmara, e o mineiro Nárcio Rodrigues, afilhado de Aécio, terá a vaga do partido na Mesa Diretora da Câmara.

¿Eles sabem que nenhum dos dois poderá ser candidato se não contar com o apoio do outro¿, filosofa Nárcio. Pannunzio registra que o entendimento de Serra e Aécio potencializa a força do partido no Congresso. Em tempos de lua-de-mel, Nárcio gastou a quinta-feira em conversas com Serra e Geraldo Alckmin, em São Paulo; e, terça-feira, leva Pannunzio a Belo Horizonte para conversar com Aécio. Para não correr riscos, o PSDB decidiu não entrar em aventuras na disputa da presidência da Câmara e apenas vai ocupar o cargo que lhe couber.

ELEITOR ENIGMÁTICO

O PT e seu mais próximo aliado, o PSB, saíram das eleições de 2006 com suas forças concentradas no Norte-Nordeste (o PSB tem os governos do Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte; o PT, os da Bahia, Sergipe, Piauí, Pará e Acre). Por isso, brotam de lá os candidatos naturais do lado governista: Ciro Gomes (PSB), estribado pelos 667 mil votos que obteve para a Câmara e pela eleição do irmão Cid Gomes para o governo cearense; e Jaques Wagner (PT), novo governador da Bahia, que atropelou a estrutura política de Antonio Carlos Magalhães.

O PT tem outros nomes. As eleições fizeram crescer a estrela de Marta Suplicy, que se jogou de corpo e alma na campanha de Lula. Mas os próprios petistas admitem que Marta não poderia sair de uma derrota (para a Prefeitura de São Paulo, em 2004) para uma candidatura presidencial. Tudo indica que ela irá à revanche, concorrendo novamente à prefeitura em 2008. Um quarto nome, o de Dilma Rousseff, não anima muito os petistas em razão do perfil baixo que a ministra tem na seara das disputas eleitorais.

Sem poder ser candidato pelas regras atuais, Lula inspira duas grandes especulações. Uma é que almejaria um terceiro mandato, ancorado em artifícios legais que mudariam as regras da reeleição. A hipótese é refutada por petistas: ¿Um terceiro mandato em 2010 não passa pela cabeça do presidente. Ele está tomado por uma única obsessão: fazer um bom segundo governo¿, assegura o deputado Sigmaringa Seixas (DF), amigo do presidente.

A segunda é a indagação sobre o papel que desempenhará nas eleições de 2010. Alguns acham que ele fará o dever de casa, esforçando-se para eleger o candidato apoiado pelo partido; outros piscam o olho e insinuam que, ausente da disputa direta, ele poderia optar pelo confortável posto de árbitro da sua própria sucessão, guardando-se para 2014, quando terá 69 anos e, mantida a boa saúde, poderia se habilitar a dois novos mandatos.

Já o PMDB, o maior partido do Congresso, não tem lideranças nem unidade para sonhar com uma candidatura própria. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), reconhece a dificuldade de o partido ¿concretizar um projeto próprio de poder¿: ¿O PMDB não se une por causa das suas características regionais¿, alega.

O outro grande partido nacional, o PFL, depois do fraco desempenho nas eleições, voltou seu foco para as eleições municipais de 2008, nas quais tentará renovar lideranças, como os deputados Onyx Lorenzoni (RS) e Eduardo Sciarra (PR), que serão candidatos às prefeituras de Porto Alegre e Curitiba, e o prefeito Gilberto Kassab, de São Paulo, que sonha disputar a reeleição (embora seja cada vez mais provável que Geraldo Alckmin queira disputar a prefeitura paulistana).

FRASES Nárcio Rodrigues Deputado (PSDB-MG)

¿Eles sabem que nenhum dos dois poderá ser candidato se não contar com o apoio do outro¿

Sigmaringa Seixas Deputado (PT-DF) ¿Um terceiro mandato não passa pela cabeça do presidente¿